Busque por temas

Em alta

Por que estão falando tanto de… climate quitting

A expressão, que pode ser traduzida para "demissão climática", refere-se a tendência dos profissionais que pedem demissão de empresas que fazem mal, direta ou indiretamente, ao meio ambiente.

Bruno Capelas
9 de maio de 2024
Leia emminutos
Voltar ao topo

O que você precisa saber

Ao longo dos últimos anos, uma série de novos comportamentos vêm surgindo na força de trabalho – muitos deles têm nomes em inglês, mas refletem pensamentos globais, que podem acontecer aqui no Brasil, dentro da sua empresa. É o caso, por exemplo, do quiet ambition ou do quit-tok, dos quais já falamos aqui em Cajuína

Puxados pela geração Z, mas também por millennials desencantados com anos de promessas, esses comportamentos partem de uma crença importante: a de que trabalhar não serve apenas para ganhar dinheiro e pagar as contas, mas também para gerar um propósito no mundo. Uma dessas novas tendências é o chamado “climate quitting”, que poderia ser traduzido como “demissão climática” ou “desistência climática”. Ela parte de um sentimento bastante abrangente: a preocupação com o meio ambiente e as mudanças climáticas. 

De maneira geral, o “climate quitting” é uma tendência que mostra pessoas pedindo demissão de empresas que fazem mal ao meio ambiente ou não se preocupam com o seu impacto em temas como mudanças climáticas ou pegada de carbono. Além de pedidos de demissão, essa tendência também pode se refletir no recrutamento de talentos, com candidatos recusando vagas ao descobrir que a empresa não tem uma boa postura ESG. 

Pesquisas recentes em diferentes partes do planeta mostram que é uma postura que tem bastante adesão. Um levantamento global da Deloitte, feito no ano passado com as gerações millennial e Z, mostra que a maioria das pessoas dessas gerações pesquisa as políticas ambientais de uma marca antes de aceitar uma vaga de emprego. Além disso, uma a cada seis pessoas dessas duas gerações disse já ter trocado de emprego ou de setor devido a preocupações com o clima – e outros 25% pretendem fazer a mesma movimentação no futuro. 

Outra pesquisa, liderada pelo ex-CEO da Unilever Paul Polman, feita com 4 mil pessoas nos EUA e no Reino Unido, mostra que 73% dos trabalhadores tem ansiedade ao ouvir falar de mudanças climáticas – e que 61% deles gostaria de ver sua empresa agindo de maneira mais presente no tema. Enquanto isso, aqui no Brasil, uma pesquisa da consultoria Great Place to Work com 1,4 mil trabalhadores brasileiros apontou que 53% das pessoas citaram o envolvimento da empresa com causas ESG como um fator importante na busca por um novo trabalho.

Vale notar que a maioria dessas pesquisas foram feitas em 2023 ou no início de 2024 – e a cada dia que passa, mais e mais pessoas são afetadas pelas mudanças climáticas em todo o planeta, em diferentes aspectos. Ondas de calor ou emergências climáticas, como as que vemos atualmente no Rio Grande do Sul, só devem aumentar a conscientização a respeito da importância do cuidado com o meio ambiente, algo que precisa estar na pauta do RH para ontem. 

O que isso significa para o RH

O climate quitting pode ser um fenômeno mais agudo de um assunto que está longe de ser uma tendência, mas sim uma pauta perene: a preocupação das organizações com o meio ambiente, a sustentabilidade e as mudanças climáticas. Falar desse tema, porém, pode ser uma forma bastante rápida de conseguir com que RH, gestores e a alta liderança entendam que as consequências de não olhar para esse assunto podem ir muito além do impacto na natureza. 

Para o RH, o primeiro passo é saber que as pessoas estão atentas a quaisquer movimentos das organizações – e que o primeiro público a servir como promotor ou detrator da empresa está dentro de casa. Quando uma companhia reduz o orçamento de uma campanha de sustentabilidade, ela está passando uma mensagem direta à sua equipe, por exemplo. Por outro lado, quando as ações em torno das mudanças climáticas funcionam e trazem resultados, o time também poderá bater no peito orgulhoso do que está ajudando a fazer. 

Justamente por isso, para o RH é importante estabelecer uma cultura de colaboração e participação. Criar espaços e fóruns, permitindo que as pessoas tragam ideias para tornar a empresa ainda mais sustentável e responsável, tanto do ponto de vista ambiental como social, é uma forma não só de inovar, mas também de fazer com que as pessoas sentem que fazem a diferença. É importante, porém, mostrar que essas ferramentas têm poder real de promover mudanças – caso contrário, o tiro pode sair pela culatra. Tão ruim quanto ignorar o tema climático é tentar surfar nessa onda e não fazer nada – e aqui pedimos perdão por outra expressão em inglês, o chamado “greenwashing”. 

Outro ponto importante é saber que ações em torno das mudanças climáticas e da sustentabilidade não se constroem apenas com grandes gestos, mas também com pequenas posturas no dia a dia – são elas que, ao longo do tempo, podem minar a confiança de um colaborador em quem o emprega. Cada vez mais, os efeitos do aquecimento global vão causar impacto no cotidiano das organizações, seja em ondas de calor, em enchentes ou até mesmo em ventanias e chuvas que podem afetar o abastecimento de luz, água e internet do time. 

Dito isso, vale a pena começar a pensar em uma série de condutas importantes: desde a mudança do dress code ou mesmo de reuniões presenciais em dias de extremo calor, passando para a flexibilização de horários e de tarefas em meio a esse tipo de desafio. Benefícios como verba para uso de coworkings já podem fazer parte dessa conduta, mas podem não ser suficientes – ainda mais quando consideramos o impacto mental e psicológico que emergências naturais e climáticas podem causar nos colaboradores. Estabelecer parâmetros para licenças específicas ou liberação de trabalhos nessas situações pode ser um passo importante para os RHs num futuro próximo, mostrando não só uma preocupação com os colaboradores, mas também empatia com suas vidas cotidianas. 

O que mais você deveria ler

Preocupação com ESG precisa estar na pauta do RH

Em meio a conflitos globais, contratação de refugiados entra na pauta de grandes empresas

ESG: um papo com Toyota, Unilever e Ultragaz
Por que a Natura&Co trocou o salário mínimo pelo “salário digno” para os colaboradores

Bruno Capelas é jornalista. Foi repórter e editor de tecnologia do Estadão e líder de comunicação da firma de venture capital Canary. Também escreveu o livro 'Raios e Trovões – A História do Fenômeno Castelo Rá-Tim-Bum'.