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Karla Marques Felmanas, da Cimed: “sucessão familiar não é barreira para recrutar”

Vice-Presidente da Cimed, a executiva, que tem feito sucesso nas redes sociais ao mostrar os bastidores de sua rotina, fala para Cajuína sobre cultura, marketing de influência e gestão de pessoas em uma empresa familiar

Luiza Terpins
25 de setembro de 2023
karla marques felmanas cimed
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Aos 49 anos, Karla Marques Felmanas, Vice-Presidente da Cimed, terceira maior farmacêutica do Brasil em volume de vendas, fala com empolgação de tudo o que tem aprendido nos últimos meses. Ela, que já passou por diversas áreas na empresa e que hoje toca boa parte da estratégia da companhia, tem se destacado também nas redes sociais, onde compartilha bastidores de sua rotina pessoal e profissional, com direito a mostrar o dia a dia do escritório na Faria Lima, das fábricas no interior de Minas Gerais e os lançamento de produtos.

Foi muito graças a seus posts no Instagram e no TikTok, por exemplo, onde soma quase 1.5 milhão de seguidores, que o Carmed Fini, hidratante labial em parceria com a marca de guloseimas, vendeu em 10 dias o estoque previsto para três meses. “É muito legal que ano que vem eu completo 50 anos de idade e continuo me reinventando e identificando onde eu posso contribuir mais”, diz.

Entre um post e outro, Karla comanda os próximos passos da companhia ao lado do irmão, João Adibe Marques, e desenvolve a nova geração, já que tanto seus filhos quanto sobrinhos atuam na empresa. A Cimed, assim como cerca de 90% das empresas no Brasil segundo o IBGE, é familiar, mas ela garante que essa dinâmica em nada atrapalha na hora de tomar decisões ou recrutar talentos estratégicos. No papo a seguir, Karla fala sobre gestão de pessoas, cultura e a transformação da farmacêutica em marca empregadora graças à internet.

Karla, qual é o seu maior desafio enquanto Vice-Presidente da Cimed?

Tanto o meu papel quanto o do meu irmão [João Adibe Marques, Presidente da empresa], é manter a nossa liderança motivada e sempre trazendo visão de futuro para que a gente consiga entrar e executar os processos das áreas. É muita gente, né, hoje estamos com mais de 5 mil colaboradores, então não conseguimos mais participar de 100% de tudo.

Eu olho muito para a comunicação com a nossa liderança, porque no final eles é que fazem as coisas acontecerem. Aqui, a gestão é muito colaborativa. Toda decisão que tomamos é em conjunto e nunca só levando em consideração o nível da pessoa na hierarquia da empresa. A gente coloca todo mundo em uma sala para discutir e sempre em prol do que for melhor para a Cimed. Essa, aliás, é uma característica da nossa cultura: tudo o que a gente for fazer, tem que considerar a Cimed como um todo em primeiro plano, e não a carreira de um executivo, a área ou algum produto específico. Parece simples, né? Mas não é. Poucas pessoas têm essa característica de pensar em prol exclusivamente da empresa. É um desafio.

Você falou bastante sobre liderança. Quão próxima do RH da Cimed você está?

Hoje o RH responde diretamente para mim, é uma área que dificilmente eu vou terceirizar. Eu inclusive passei pelo RH quando comecei na Cimed há 30 anos. Nós damos muita importância ao setor porque eu não tenho dúvida nenhuma de que as empresas são feitas por pessoas e que precisamos desenvolver os times e mantê-los ativamente acreditando no nosso propósito. Vou te dar um exemplo: recentemente nós ganhamos um prêmio das melhores e maiores empresas para se trabalhar, e olha que a Cimed é uma empresa muito presencial. A gente sabe de concorrentes que param de trabalhar às sextas-feiras às duas da tarde, e aqui a gente tem sabadão de venda, domingão do João…Quando você olha um pouquinho das empresas mais desejadas pelas pessoas, a gente se sente até um pouco na contramão porque nossa cultura é muito intensa. Aqui é 7×7, é vestir roupa amarela. Nós ficamos no mesmo prédio do Google e do BTG e eles têm praticamente metade do prédio. Esses dias, conversando com o CFO do BTG, ele perguntou quantos andares nós temos, e eu disse: ‘pô, nem um andar inteiro!’. É que é tanta gente de amarelo circulando que o pessoal acha que somos ainda maiores. E como a gente faz isso acontecer? Tem que ser muito de verdade. Ninguém é obrigado a vestir amarelo, mas o pessoal gosta. Essa cultura, essa relação com os colaboradores, vem muito do trabalho do RH.

Nós damos muita importância ao RH porque eu não tenho dúvida nenhuma de que as empresas são feitas por pessoas e que precisamos desenvolver os times e mantê-los ativamente acreditando no nosso propósito.

Qual é o modelo de trabalho que vocês aplicam hoje? É 100% presencial?

Não, temos uma política de home office de um a dois dias por semana. Pouquíssimas áreas eu ainda tenho gente que está 100% home office. Eu e o João Adibe acreditamos muito na flexibilidade. Às vezes é o rodízio do teu carro, ou um dia inteiro de reuniões por vídeo…nesse caso, tanto faz se você está na sua mesa ou trabalhando de casa. É importante ter essa flexibilidade para decidir de onde o seu dia será mais produtivo, seja do escritório, de casa, da praia. No final, o que importa é a contribuição da pessoa, o resultado que ela traz.

Eu costumo falar que aqui não é escola que tem horário para entrar e sair, mas ao mesmo tempo eu acho muito importante frequentar os ambientes da empresas. Eu fico imaginando como é que você tem condição de crescer profissionalmente se você é uma pessoa que só fica atrás do computador. Porque uma reunião de vídeo é uma reunião pontual, você começa um assunto, termina o assunto, tchau, obrigada. Já no presencial você tem outros compartilhamentos de ideias, adquire conhecimentos, pega outras oportunidades. A gente acredita que é muito difícil uma pessoa evoluir à distância. Agora se a pessoa busca por uma carreira em Y, se ela quer ser especialista, então talvez seja ok ela ficar em modelo remoto.

A Cimed é uma empresa que foi fundada pelo seu pai há 46 anos. Como manter a cultura da empresa viva depois de tanto tempo?

Há dois anos a gente contratou um consultor para nos ajudar com isso. Porque é fácil falar de cultura, mas é difícil explicar, né. Eu até li aquele livro da Netflix, o “A Regra é Não Ter Regras”, que foi uma leitura importante para eu entender um pouco mais sobre esse trabalho de cultura, mas trazer esse consultor foi fundamental. Quando ele chegou, eu e o João Adibe começamos a contar toda a história, todos os rituais que a gente já tinha, os nossos valores, mas ele logo falou que não era bem assim que se constrói a cultura de uma empresa, que ele precisava conversar com a base da Cimed. Faz sentido, né, porque conforme a empresa vai crescendo, você vai se distanciando da base, e a gente precisa manter os nossos valores muito presentes na companhia, para que cada pessoa que entrar olhe aquilo e pense “isso faz muito sentido para mim”.

Esse cara entrevistou mais de mil pessoas dentro de uma estrutura toda, foi um trabalho de oito meses de diagnóstico, conversando com gente do escritório, da fábrica, junto, misturado. Foi uma jornada muito bacana, e para a nossa surpresa e felicidade, tudo o que eu e o João Adibe íamos falar, foi o que a base trouxe. Nesse ponto, a gente se difere muito das outras empresas, que costumam desenhar um projeto de cultura e depois repassar através de iniciativas de comunicação. No nosso caso, a gente já tinha a cultura, só faltava colocá-la nas paredes.

Você está na Cimed há 30 anos. Como foi o seu desenvolvimento na empresa?

Eu já passei por praticamente todas as áreas da empresa nessas três décadas. Conforme eu ia adquirindo conhecimento, eu pegava mais áreas para tocar. Foi tudo muito orgânico, eu nunca tive um plano de carreira. Um exemplo disso foi o que aconteceu esse ano com o Carmed. Por conta do sucesso que teve a nossa parceria com a Fini, eu comecei a me envolver mais com áreas que até então não me envolvia, como o marketing. Agora tenho participado ativamente da estratégia de comunicação, entendi qual é o jogo das redes sociais. É muito legal, né, porque ano que vem eu completo 50 anos de idade e continuo me reinventando e identificando onde eu posso contribuir mais.

Imagino que tenha outras pessoas que, assim como você, estão há muitos anos na empresa. E também tem gente recém-chegada, como os seus filhos e sobrinhos, por exemplo, que já trabalham na Cimed. É um desafio lidar com várias gerações ao mesmo tempo?

Não é um desafio porque a Cimed já nasceu assim. Eu comecei a trabalhar com o meu pai e a minha mãe na gestão, então esse choque de idade já existia. Hoje o engraçado é que eu e o João Adibe estamos passando pela mesma coisa, agora com nossos filhos. O difícil é separar a casa do trabalho, isso nem acontece. Se eu estou tomando banho e um filho entra para comentar algo de trabalho, é porque ele está motivado, animado, e eu tenho que aproveitar essa oportunidade, e não colocar uma barreira.

E como vocês fazem para que essa dinâmica familiar não impacte a estratégia?

Assim como na época dos meus pais na gestão, nós nunca fomos tratados como filhos na empresa. O mesmo acontece com os meninos que estão entrando agora. A gente trabalha em prol da empresa, e não de algum executivo. Toda vez que nós temos alguma situação de desalinhamento, a gente conversa até chegar no que for melhor para a Cimed.

Vocês já tiveram alguma resistência de executivos por conta da nova geração? A cultura de sucessão familiar já foi um problema para atrair e recrutar talentos estratégicos?

Nunca foi um problema. O que já aconteceu foi de ter executivo mais velho me procurando para falar que a Juliana [filha] ou o Adibe [sobrinho] tinham tomado alguma atitude talvez não muito adequada em uma reunião. Eu olhei para a cara dele e falei: ‘então preciso da sua colaboração para me ajudar. Chama eles para conversar, traz seu ponto de vista. Porque olha que maravilhoso esses meninos estarem na Cimed. Eles não estão aqui para construir patrimônio, estão porque querem estar. Então, me ajude a desenvolvê-los.

E sobre recrutamento, é aquela coisa do fit cultural, né? Eu combino ou não combino com a empresa? Se os valores da companhia não dizem nada a você, uma ótima dica é nem vir.

Leia também: Só o salário não basta: como atrair e reter talentos de alta performance

Karla, nos últimos meses, por conta do lançamento do Carmed Fini, a Cimed passou de uma farmacêutica tradicional para uma tendência nas redes sociais. Como isso tem impactado na marca empregadora?

Olha, tem sido uma loucura. Vou te dar um exemplo que aconteceu há pouco tempo: a Juliana, minha filha, sempre traz estagiários de férias para trabalhar com ela na área de planejamento estratégico e relacionamento com investidor. Como ela fez FGV e tem bastante contatos, sempre aciona eles nessas oportunidades ou quando tem uma demanda de um projeto específico. É trabalho de 30 dias, né, tem começo, meio e fim, então é mais simples. Daí eis que meses atrás estávamos em um trem no Japão e a Ju me fala: ‘mãe, vamos soltar no seu Instagram um formulário para escolher o estagiário dessas férias?’. Em pouco tempo tivemos 5.600 pessoas inscritas para essa vaga. É o que eu digo: a gente está plantando uma semente agora e nem imaginamos o que está por vir.

No caso do Carmed, por exemplo, é um produto para diversas faixas-etárias, da menina de cinco anos até uma pessoa mais velha. Pega essa galera de 16 anos, que é a mais apaixonada pelo produto e que conheceu a Cimed por conta do Carmed. O meu principal business hoje, 65% do nosso faturamento, são os medicamentos. Eu estou agora criando uma relação com esse consumidor que, daqui 20, 30 anos, vai consumir os remédios da Cimed. É uma coisa muito forte e a gente ainda nem consegue tangibilizar o que é isso ainda.

E muito disso aconteceu porque você começou a se expor nas redes sociais. Como você concilia a rotina de executiva com a de influenciadora?

É mais uma loucura, porque foi mais uma coisa que eu enfiei na minha jornada profissional. Mas, assim, eu sou super organizada, então tem sido fácil. Eu tenho um calendário do que eu vou fazer, além de duas pessoas que me ajudam com isso. Eu enxergo as redes sociais não só como canais com o público que consome nossos produtos, mas com nossos colaboradores. Volta e meia gente que trabalha na empresa me manda mensagens e perguntas no Instagram e eu adoro ter essa proximidade com eles. A minha dificuldade hoje é como eu consigo ainda manter esse contato mesmo tendo crescido tanto. Eu não quero ser um fantasma nas redes sociais, onde só eu falo e ninguém fala comigo. Eu sempre peço para as pessoas interagirem, falarem o que estão achando, me darem feedback. Tenho aprendido bastante. Hoje já estou no Linkedin, no Instagram e no TikTok. Youtube ainda não entrei porque ainda não tive tempo, mas quero muito.

Temos visto cada vez mais executivos investirem em suas presenças nas redes sociais. Tem outros C-levels te procurando para pedir dicas? Acha que é uma tendência?

Hoje, toda vez que a gente tem encontros com nossos clientes, que são empresas gigantescas, a coisa que eles mais perguntam é como a gente fez isso acontecer. Querem saber como é o dia a dia, o que é bacana, o que não é, como eles podem entrar nas redes, a importância disso para o negócio. É tudo muito novo ainda, né. Nós trabalhamos na empresa e ao mesmo tempo somos influenciadores dos nossos próprios produtos. O próprio TikTok tem me chamado para conversar com as empresas e contar minha experiência. E, de novo, é muito bacana estar prestes a fazer 50 anos e virar referência para uma coisa que é muito do mundo jovem.

Nós trabalhamos na empresa e ao mesmo tempo somos influenciadores dos nossos próprios produtos.

E no caso de vocês, viram um retorno muito rápido, né?

Total. No começo da história do Carmed, a gente fez estoque do produto para vender em três meses e vendemos tudo em 10 dias. Tudo isso foi graças às redes sociais e, melhor ainda: de maneira orgânica em nossos perfis. Essa relação dos executivos com as redes sociais vai ser muito importante daqui para frente.

Karla, para finalizar, qual é o maior desafio da liderança na sua opinião, seja ela de RH ou não?

Eu acredito muito na liderança por exemplo, independente do caminho que você encontrar para se comunicar com o seu time. Pode ser no digital, presencial, na forma que faz reuniões…Se você fala uma coisa e executa outra, não adianta nada. Eu batalho todos os dias para seguir isso, porque temos que ser de verdade.

Luiza Terpins é Editora de Cajuína e Líder de Conteúdo e Comunicação da Caju.