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Tecnologia, liderança e visão estratégica: um papo com Nathalia Tupinambá, CHRO da LWSA

Após passar por empresas como Odebrecht, Braskem e McKinsey, executiva assumiu cadeira na dona da Locaweb, em momento de reorganização após sequência de aquisições; para executiva, automatização é chave para qualificar o trabalho do futuro

Bruno Capelas
20 de maio de 2025
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Simplificar e, ao mesmo tempo, amplificar. Essa é a visão de Nathalia Tupinambá para o RH da LWSA, empresa que nasceu nos anos 1990 pela Locaweb e hoje reúne também marcas como Vindi, Melhor Envio, Bling e Tray. Às vésperas de completar um ano como CHRO da companhia, ela assumiu a missão de integrar oito RHs em uma única área. “Era um prato cheio de desafios e eu sentia que ia poder trazer um impacto gigantesco na organização”, conta a executiva, em entrevista a Cajuína. 

Com passagens por empresas como Odebrecht, Braskem e McKinsey e mais de 15 anos trabalhando na área, Nathalia se apaixonou pelo RH ainda na faculdade, quando fez parte da empresa júnior da Fundação Getulio Vargas (FGV-SP). “Tudo ali dentro era baseado em motivar as pessoas e conectar os elos nos times para que as entregas fossem melhores como conjunto”, diz. 

A mesma missão segue hoje, afirma ela, mas em uma escala muito diferente. “o que alguém quer é diferente do que o colega quer. Como entregar para ambos as ferramentas necessárias, dado que somos uma empresa produtizada e que entrega experiência padronizada para o mesmo tipo de colaborador?”, diz, sobre os principais desafios que vê no RH. Na entrevista a seguir, ela repassa sua trajetória profissional, fala sobre a chegada na LWSA e discute temas como tecnologia, automatização de processos e inteligência artificial. Confira os principais trechos da entrevista. 

Ali tive o estalo de que eu gostava muito de alavancar o potencial das pessoas. É o papel de qualquer liderança, mas amo o fato de que o RH tem isso como missão principal. 

Nathalia, como você foi parar no RH? 

Eu fiz Administração de Empresas e, logo que entrei na faculdade, entrei na empresa júnior. Participei daquilo sem nem saber o que era uma empresa júnior, mas acabei me apaixonando pela área de RH. Tudo ali dentro era baseado em motivar as pessoas e conectar os elos nos times para que as entregas fossem melhores como conjunto. Ali tive o estalo de que eu gostava muito de alavancar o potencial das pessoas. É o papel de qualquer liderança, mas amo o fato de que o RH tem isso como missão principal. 

Como foi passar do ambiente de empresa júnior para o mundo corporativo? 

Eu saí da faculdade com certeza absoluta de que queria ser RH. Era uma vontade muito forte e muito clara. Comecei a buscar estágios e fiz vários processos seletivos em grandes empresas – e eu buscava companhias que fossem referências e tivessem o RH no centro. Em muitos lugares, me ofereciam vagas de Marketing, mas eu não queria. Nisso, eu acabei caindo na Odebrecht, que tinha uma cultura muito forte – e ali eu sabia que ia aprender muito sobre cultura. Acabei ficando dez anos no grupo. 

Como foi viver as diferentes fases de empresas como a Odebrecht e a Braskem? 

Imagina que eu entrei como estagiária em uma das melhores empresas para se trabalhar do Brasil. Como RH, ao longo de dez anos, eu passei por todas as áreas: fui de recrutamento e seleção, treinamento e desenvolvimento, fiz programa de estágio, lancei comitê de diversidade. E sempre que eu mudava de área no RH, eu também mudava internamente no grupo. Trabalhei em plataformas de petróleo, em saneamento básico, até numa hidrelétrica em Rondônia. Durante muito tempo, era muito legal e era muito fácil de recrutar as pessoas, porque havia uma cultura bacana, na marca de ser agente do próprio destino. Quando chegou a Lava-Jato, porém, eu comecei a repensar minha relação com a empresa, mas foi nesse momento que recebi o convite para reconstruir a cultura da Braskem, que estava um pouco isolada daquela questão no momento, era uma empresa de capital aberto. Foi um projeto muito interessante como aprendizado, em um momento que a companhia perdia talentos, trazendo temas como inovação e sustentabilidade para dentro de casa. Depois, a Braskem passou por outras dificuldades, mas ali eu já tinha saído.  

Depois de dez anos no RH de empresas, você viveu uma transição de carreira e foi trabalhar na McKinsey, atuando em consultoria. Como foi essa mudança? 

A Lava-Jato me fez pensar se a Odebrecht era o lugar certo para trabalhar. Decidi ir fazer um MBA, fiquei dois anos nos EUA, e aproveitei para fazer um estágio em uma área diferente. Eu nunca tive dúvidas sobre meu futuro no RH, mas tinha uma questão de buscar um olhar mais estratégico para o RH, e achei que uma experiência numa consultoria me daria isso. Eu havia passado 10 anos em uma só cultura. Na McKinsey, um projeto dura três meses – de maneira que, em quatro anos, eu passei por mais empresas e culturas do que passei em 10 na Odebrecht. Ao longo do meu tempo na McKinsey, consegui fazer 100% dos meus projetos no RH, com uma visão de helicóptero. E isso me abriu portas. Se na Odebrecht eu quisesse fazer a melhor avaliação de performance do mundo, eu ia falar com três ou quatro pessoas. Na McKinsey, eu podia falar com referências globais como Microsoft, Netflix ou Google. Acabei ficando lá por quase cinco anos, saindo duas vezes em licença-maternidade. No meio do processo, percebi porém que me faltava o brilho no olho de estar no RH – e aí decidi voltar para uma cadeira para a qual eu estivesse preparada.  

Como foi o convite para assumir o RH da LWSA? 

Retomar o brilho no olho era muito importante e eu queria ver um projeto com começo, meio e fim. Queria ir para um lugar em que pudesse ficar por alguns anos, vivendo um casamento, uma sinergia. O convite veio justamente nessa ideia de ter um olhar generalista de RH, vendo o que eu poderia agregar no estratégico. A LWSA é uma empresa de sucesso, mas tinha passado por várias aquisições e o desafio era consolidar os oito RHs existentes em um só. Era um prato cheio de desafios e eu sentia que ia poder trazer um impacto gigantesco na organização. O convite aconteceu inclusive durante a minha licença, mas eles esperaram eu terminar aquele período e fazer o movimento depois.  

Você está na cadeira há pouco menos de um ano. Que balanço faz da primeira temporada? 

A principal conclusão foi de que eu fiz um movimento correto – e pude vivenciar na prática as minhas expectativas. Hoje, consigo mostrar que o RH consolidado entrega muito valor, em dois movimentos distintos. Um deles é simplificar. Antes, havia oito pessoas fazendo oito comunicados de Dia dos Pais. O outro é amplificar: havia campanha de vacina da gripe, mas só em quatro das oito empresas do grupo. Agora, há para todas. São exemplos operacionais, mas que fazem sentido no dia a dia. Dentro de recrutamento e seleção, por exemplo, as empresas do grupo concorriam entre si. Se já é difícil contratar desenvolvedor, imagina com três companhias do mesmo grupo fazendo contraproposta entre si. É um exemplo fictício, mas que poderia ocorrer e não ocorre mais: hoje, temos um squad especializado em contratar desenvolvedor, por exemplo. Tem sido muito gratificante ver que o que a gente está construindo gera valores, além de construir indicadores e automatizar processos

Quais são os desafios do segundo ano? 

Tem duas alavancas que nos norteiam. Uma é a estratégia do negócio, pensando na sinergia das alavancas do RH. Vou dar um exemplo concreto: que incentivo preciso dar para fazer o colaborador chegar na meta de negócios? Como penso na remuneração dos executivos? E nas competências do futuro. O principal desafio é saber como a estratégia do RH funciona para a LWSA num horizonte de cinco anos. O outro movimento é de automatização, ainda integrando os oito RHs, usando IA para melhorar os desafios. Hoje, usamos o RH como piloto, mas depois cascateamos o avanço para toda a empresa. E sei que o tema gera muito buzz, mas na prática isso significa, muitas vezes, redesenhar os processos do zero. 

Lidar com tecnologia hoje é uma missão de todos os RHs. Mas como é fazer isso numa empresa de tecnologia, trazendo uma experiência à altura da expectativa dos profissionais? 

Buscamos fazer um bom trabalho como tecnologia. Somos simplistas, mas tecnológicos. O que quer dizer isso? Que você não vai entrar na LWSA e ver que tudo é mirabolante, mas você não vai demorar para ter uma conexão com computador. Em outras empresas, a pessoa é contratada, tem processo manual para enviar documentos e espera cinco dias para chegar uma máquina. Aqui, não: a admissão é digital, a pessoa entra rápido, o sistema funciona no mesmo dia. Vai ser o melhor computador do mundo? Não. Mas vai ser adequado. Somos tecnológicos no que nos propomos a entregar. 

Você comentou sobre automatização de processo no RH. Em que tarefas a IA já tem feito diferença na LWSA? 

Temos um case bacana hoje de onboarding quanto à comunicação. Hoje, quando o colaborador entra, todo o processo é automatizado, das boas-vindas ao conteúdo que ele precisa passar. No primeiro dia, ele recebe uma apresentação institucional. Depois, aprende sobre código de ética. Após três dias, ele passa por um processo de gamificação para conhecer as empresas do grupo – e cada quiz rende créditos no nosso e-commerce interno. Hoje, os primeiros três meses da pessoa tem comunicação automática. Outro bom exemplo é de recrutamento. Antigamente, para recrutar a gente precisava fazer uma extração manual dentro do sistema de ATS – no nosso caso, a Gupy. Hoje, não: já temos um API que faz o trabalho de forma automática, criando um ranking de ordem de currículos com auxílio de IA. Ao fazer entrevistas com candidatos, a IA também acompanha e começa a criar um perfil do candidato, o que nos ajuda na hora da seleção. 

IA hoje é um tema que empolga, mas que também deixa muita gente com medo do futuro – especialmente por perder o emprego. Como você trabalha com o tema na LWSA? 

Isso não é uma dor para nós no RH da LWSA. Primeiro, porque estamos num momento de crescimento – e se vamos crescer, o que precisamos é entregar mais com as mesmas pessoas. Não há desconforto: o prato está cheio e só precisamos usar os recursos da melhor forma. Não falo nem de eficiência. Falo de automação para liberar as competências para algo estratégico, liberando as pessoas para fazer tarefas que agregam mais valor para o negócio. E para isso, é preciso preparar as pessoas para atuarem num nível acima. O que acontece hoje é que uma parcela da população está acostumada a fazer atividades operacionais e precisa desenvolver as competências. A questão é que a IA está vindo com celeridade, fazendo mais do que achávamos que ela poderia fazer. É preciso preparar a população para o novo escopo – essa é uma pergunta que o RH, bem como a universidade e as lideranças de empresas precisam fazer. Mas na LWSA, sinto que temos um backlog: enquanto tiramos uma tarefa do colaborador, colocamos outra no prato dele. E por enquanto o prato está cheio. 

É um problema que sempre existiu, mas é uma dor latente: como atrair as pessoas corretas e fazer a personalização para quem entra na empresa? Isso passa pela personalização da experiência do colaborador.

De maneira geral, que desafios você enxerga para o RH hoje em dia?

Para mim, enxergo um grande desafio de equilibrar a entrada de novas gerações no mercado com as gerações atuais. Existe um clash cultural entre as expectativas das gerações. É um problema que sempre existiu, mas é uma dor latente: como atrair as pessoas corretas e fazer a personalização para quem entra na empresa? Isso passa pela personalização da experiência do colaborador. É algo que vai além da geração, mas isso entra na conta: o que alguém quer é diferente do que o colega quer. Como entregar para ambos as ferramentas necessárias, dado que somos uma empresa produtizada e que entrega experiência padronizada para o mesmo tipo de colaborador? Agora, acho que estamos começando a aprender o que isso significa para o RH. 

Você comentou que deseja passar muito tempo no RH da LWSA. Que trabalho almeja entregar? 

Quando entrei na LWSA, comecei a redesenhar os processos. Minha primeira premissa foi não fazer nenhum cavalo de pau, mas sim entender o que é bom, melhorar os processos e fazer benchmarks. O que imagino daqui a cinco anos? Dizer que tenho o melhor RH. Quero lançar tendências, gerar ideias que criem impacto no RH de modo geral. Quero mudar os ponteiros do RH, dizer que fazemos algo que nenhum outro RH está fazendo. 

Para fechar, você tem alguma dica de leitura? 

Um livro que marcou muito foi o A Regra é Não Ter Regras, do Reed Hastings e da Erin Mayer, que fala sobre a Netflix. Foi um livro que ficou muito conhecido por falar da política de férias da Netflix, do lançamento de tendências, mas o que eu achei interessante no livro é que ele tangibiliza o que isso significa. O livro explica como o RH e a liderança repensam os porquês das coisas. A recomendação é menos sobre a Netflix em si, mas mais sobre a mentalidade de questionar e estar ao lado dos líderes na estratégia de negócio que o RH deve ter. É algo que se vincula com o momento que estou.

Bruno Capelas é jornalista. Foi repórter e editor de tecnologia do Estadão e líder de comunicação da firma de venture capital Canary. Também escreveu o livro 'Raios e Trovões – A História do Fenômeno Castelo Rá-Tim-Bum'.