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Por que a Kraft Heinz treina as competências socioemocionais dos colaboradores

Após investir em mentorias e jornadas de autoconhecimento, companhia criou trilhas para garantir que colaboradores ganhem conhecimento pessoal para além das habilidades técnicas; programa tem participação de assessoria especializada

Vanessa Fajardo
9 de janeiro de 2025
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Uma das maiores empresas do mundo no setor de alimentos e bebidas, a Kraft Heinz percebeu há cinco anos que precisava oferecer oportunidades diferentes para desenvolver seus líderes no Brasil. Com operação em mais de 40 países, a companhia notou que era necessário ir além das habilidades técnicas e apostar no autoconhecimento. Foi o embrião de uma jornada que hoje ajuda a treinar os 3 mil colaboradores da empresa no País. 

Criado em parceria com a consultoria Learn to Fly, o projeto nasceu para auxiliar no desenvolvimento pessoal dos colaboradores, com direito a um mapeamento das competências socioemocionais do time. Depois do diagnóstico, a organização inaugurou em 2024 uma plataforma com trilhas personalizadas para ajudar a aperfeiçoar habilidades que vão além do conhecimento técnico e estão atreladas ao seu propósito. 

“Nossa cultura está obviamente pautada em resultados. Mas, mais do que isso, queremos preparar pessoas para o futuro do Brasil. Quanto mais conseguirmos formar seres humanos para o mercado, melhor será a rentabilidade para a nossa marca”, diz Carol Dias, diretora de Pessoas e Performance da Kraft Heinz Brasil.

Hoje, a plataforma que auxilia no desenvolvimento de habilidades como resiliência e comunicação está disponível para todos os colaboradores da Kraft Heinz espalhados pelo país. Ao todo, a empresa tem quatro fábricas (duas em Goiás, além de São Paulo e Santa Catarina), dois centros de distribuição (GO e SC) e um escritório central em São Paulo. 

Na entrevista a seguir, Carol Dias conta os passos até a implementação do projeto, a importância da autenticidade na organização e o valor atribuído ao desenvolvimento pessoal dos funcionários.

É impossível falar de negócios rentáveis sem pessoas competentes, boas e felizes.

Como a Kraft Heinz percebeu que deveria investir no autoconhecimento dos colaboradores?

Há cinco anos, tínhamos um cenário diferente do que temos hoje. Havia muitas lideranças jovens não só de idade, mas que precisavam de uma direção. Por outro lado, não tínhamos experiência nesse direcionamento – então como íamos exigir aquilo que não tínhamos? Era preciso dar algum suporte para que essa liderança se autoconhecesse e pudesse liderar os times. Na época, conhecemos o trabalho da Learn to Fly, que nos assessora com base científica. Começamos a fazer as conexões das competências que os líderes sêniores tinham como fortalezas e o que ainda precisava ser desenvolvido. 

Hoje, vocês possuem um plano de mentoria bem estruturado. Como ele nasceu e contribuiu para esta iniciativa?

Ele contribuiu muito. Primeiro: o trabalho foi feito por meio da mesma plataforma. Segundo: as pessoas passaram a confiar mais no processo. As mentorias são estruturadas com perguntas técnicas e base científica, para não virar só aquele papo de falar mal do chefe. 

Para participar, a pessoa preenche um questionário com valores, sonhos e ambições. A partir disso, o sistema da Fly to Learn faz uma análise e dá um match quando há afinidade com outra pessoa, formando as duplas que seguem a jornada fazendo a quantidade de mentorias que elas combinaram no início do processo. Há cinco anos, eram 11 duplas. Hoje, são 66, o que também ajuda a construir uma rede de apoio bastante significativa. Como resultado, tivemos a diminuição do nosso turnover. As pessoas começaram a mostrar muito mais felicidade no trabalho, porque tinham conversas mais transparentes entre líderes e liderados, sem ter nenhum rótulo ou julgamento predisposto. 

E como essa iniciativa evoluiu para o programa de desenvolvimento de competências emocionais que existe hoje?

Nosso principal desafio foi entender como uma organização que cresce com diversidade poderia manter o autoconhecimento entre os colaboradores e, ao mesmo tempo, trabalhar competências socioemocionais que são aprendidas na escola ou no MBA, ao longo da vida. 

Fizemos um mapeamento de 100% de organização – e aqui estamos falando de quase 3.000 colaboradores, desde as pessoas que operam a nossa planta até as que tomam decisões. Chegamos a um grupo de cerca de 70 competências socioemocionais. Daí, cruzamos essas competências com os nossos valores e missão. Nos últimos 10 meses, começamos a fazer um fortalecimento com base nessas competências que a gente mapeou. 

Nossa cultura está obviamente pautada em resultados. Mas, mais do que isso, queremos preparar pessoas para o futuro do Brasil. Quanto mais conseguirmos formar seres humanos para o mercado, melhor será a rentabilidade para a nossa marca – a ponto de que as pessoas que saem da companhia podem continuar usando a plataforma por mais seis meses. 

A iniciativa é voltada somente para os líderes da organização?

Começamos com as lideranças seniores da companhia. Quando vimos os resultados,  desdobramos para 100% das pessoas, mas o programa não é obrigatório. Hoje, em média, 700 pessoas participaram da plataforma para se desenvolverem. A nossa expectativa para os próximos anos é conseguir ter mais flexibilidade na rotina, para que 100% do time no Brasil tenha essa oportunidade de se desenvolver e estudar uma maneira diferente de comportamento.

Na prática, como funciona essa plataforma? 

É uma plataforma que você pode abrir pelo seu aplicativo ou pelo computador. São cinco trilhas diferentes disponíveis, que desenvolvem aproximadamente 20 competências socioemocionais. A pessoa desenha o plano de desenvolvimento individual a partir de experiências específicas. Por exemplo: alguém pode querer desenvolver a presença para conseguir falar com alguém sem olhar o celular, porque estamos multitasking o tempo todo. Se eu colocar que meu objetivo é desenvolver presença, resiliência e comunicação, a plataforma vai me indicar uma trilha, com quatro a cinco sessões. Dá para escolher uma ou duas por mês, considerando o que se encaixa melhor na agenda. 

A cada três meses em que uma trilha é disponibilizada, há um webinar com indicações de livros e artigos. Um especialista também é convidado para trocar ideias e tudo funciona 100% online. Todos têm acesso, mas as pessoas participam à medida que entendem que o programa é efetivo para suas carreiras.

Falar de questões emocionais pode ser delicado. Como a organização acessa os resultados?

Os colaboradores têm acesso aos seus resultados individuais. Eu, enquanto RH, só consigo olhar para os números brutos. Posso “dar um zoom” em algum resultado se houver, no mínimo, cinco colaboradores que responderam. Mas, se de alguma maneira esse dado for fragilizar a confidencialidade, não temos acesso. Foi algo alinhado desde o início para dar confiança para as pessoas responderem e traçarem seu plano de desenvolvimento. 

Investir em autoconhecimento e desenvolvimento de competências socioemocionais dos colaboradores traz resultados positivos para o negócio? 

Acredito que se as pessoas trabalham felizes e são respeitadas, automaticamente haverá uma alta performance. É impossível falar de negócios rentáveis sem pessoas competentes, boas e felizes. 

E como vocês olham para as competências técnicas?

Temos o sistema interno global que se chama Work Day e engloba o plano de desenvolvimento individual, feedbacks, históricos e metas mensais. É um casamento das duas plataformas que geram relatórios e ajudam a consolidar conversas entre líder e liderado. 

E quais as habilidades são valorizadas pela Kraft Heinz na hora de contratar novos colaboradores?

Ter um mindset flexível, estar disposto a aprender algo diferente do que a vida já ensinou, além de ter muita autenticidade. Nesta jornada iniciada há cinco anos, o que vimos de mais valor foi o profissional conseguir ser autêntico, ter simplicidade e não carregar uma persona quando entra no mundo corporativo. Se você consegue ter autenticidade e cabeça aberta para aprender coisas novas, sabendo se diferenciar, você tem a receita ideal para conseguir ser feliz no nosso modelo.

Vanessa Fajardo é jornalista, com passagens pelas redações do portal G1 e Agora SP. Também faz contribuições para veículos como Estadão, BBC Brasil, UOL e Porvir.