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Lições do autor de “Pense Como um Artista” para o trabalho

Atual diretor artístico do Barbican Centre, o crítico britânico de arte Will Gompertz está lançando um novo livro, Como Os Artistas Veem o Mundo; obra mostra como as pessoas (e os executivos!) podem aguçar seu olhar por meio da arte

Karina Sérgio Gomes
1 de outubro de 2023
Will Gompertz Pense como um artista
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Diretor artístico do Barbican Centre, o crítico de arte britânico Will Gompertz tem uma longa carreira de duas décadas na imprensa inglesa (em publicações como BBC, Times e The Guardian), além de ter trabalhado em instituições como a Tate Gallery. Aqui no Brasil, porém, ele é mais conhecido pelos best-sellers Isso É Arte? e Pense Como Um Artista, que o tornaram reconhecido pela capacidade de escrever sobre arte com um estilo envolvente, capaz de atrair quem não é iniciado no assunto.

Em seu novo livro, Como Os Artistas Veem o Mundo (Zahar, 316 págs. R$ 99,90), o britânico assina o perfil de 31 grandes nomes das artes visuais, a partir de suas habilidades únicas em mostrar de maneira peculiar para as pessoas temas de conhecimento geral – como dor, política, isolamento, ambiguidade e luz. Mais do que lições de arte, o livro também pode servir como inspiração para líderes e gestores em meio a um cotidiano cada vez mais exigente. “Eles [os artistas] aprenderam que a única maneira de ver verdadeiramente é afastar-se da loucura da nossa vida cotidiana e pressionar o ‘pause'”, explica.

Ao contrário do que muitos poderiam imaginar, para Gompertz, o universo dos negócios e das artes não está completamente dissociado. “O artista norte-americano Andy Warhol certa vez disse: ‘…um bom negócio é a melhor arte’. Criar algo material que antes só existia na mente de um indivíduo é um ato extraordinário de criação. Acredito que a capacidade de um artista de imaginar e depois realizar essas imaginações materialmente em uma pintura ou escultura pode e deve ser aplicada ao mundo dos negócios”, comenta ele na entrevista concedida a Cajuína. Nos próximos parágrafos, ele também fala mais sobre como a arte pode ajudar gestores e líderes a terem ambientes mais criativos, além de indicar cinco obras que qualquer executivo deveria conhecer.

“Acredito que a capacidade de um artista de imaginar e depois realizar essas imaginações materialmente em uma pintura ou escultura pode e deve ser aplicada ao mundo dos negócios”

O título do seu livro é “See what you’re missing” [“veja o que você está perdendo”, em português], mas a tradução brasileira tem o nome de Como Os Artistas Veem o Mundo. Como podemos instigar nossos olhos a ver o que geralmente não é facilmente visto?

David Hockney, artista britânico, disse certa vez: “Olhar de verdade é realmente difícil!” Ele está correto. Passamos nossas vidas apressados, raramente parando para nos concentrar adequadamente em qualquer coisa. Mas os artistas adotam uma abordagem diferente. Eles são “olhadores profissionais”. Eles aprenderam que a única maneira de realmente ver é se afastar da loucura de nossas vidas cotidianas e apertar o “pause”. Se realmente pararmos e olharmos, olharmos de verdade, podemos começar a ver o que perdemos há muito: a magnífica beleza do tempo e do lugar em que existimos.

No livro, você destaca algumas das habilidades dos artistas de materializar situações ou sentimentos abstratos em imagens ou objetos. Como isso pode ser traduzido para ambientes corporativos?

O artista norte-americano Andy Warhol certa vez disse: “…um bom negócio é a melhor arte”. Como sempre com Warhol, a afirmação é, ao mesmo tempo, descontraída e profunda. O que ele estava sugerindo é que os negócios são uma forma de arte. Criar algo material que antes só existia na mente de um indivíduo é um ato extraordinário de criação. Portanto, sim, a capacidade de um artista de imaginar e depois realizar essas imaginações materialmente em uma pintura ou escultura pode e deve ser aplicada ao mundo dos negócios.

Um dos principais temas de Como Os Artistas Veem o Mundo é o reconhecimento de que somos quase todos iguais, exceto por um pequeno percentual de nós que vê o mundo um pouco diferente. Nenhuma pessoa tem exatamente a mesma perspectiva; cada um de nós é único em como vemos. É uma pequena diferença, mas que muda a vida — para você e para os outros — quando você descobre sua maneira individual de ver e compartilhar essa perspectiva com os outros. Se você puder ajudar a extrair esse pequeno, mas vital, elemento de cada indivíduo no trabalho, todos serão mais felizes e mais realizados.

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O que alguém que trabalha em um ambiente corporativo pode aprender de um artista sobre como transmitir suas ideias para serem executadas como imaginadas e como captar tendências?

Arte e negócios tratam da mesma coisa: ideias importantes, brilhantemente executadas. Nenhuma ideia pode ser executada exatamente como imaginada. Artistas precisam se comprometer, mas a perfeição é impossível. Lutar pela perfeição, entretanto, é nobre e sério. O truque, como todos os artistas sabem, é entender quais batalhas travar. Onde estaria a Apple sem o gênio do design de Jonathan Ive [que desenhou diversos produtos da empresa do Vale do Silício como o iPod], ou a indústria automobilística italiana sem a Pininfarina [empresa de design de carroceria que desenhou carros para marcas como Ferrari, Fiat e Alfa Romeo]? Quando você une arte e negócios, as possibilidades são infinitas, emocionantes e muito famosas.

“Arte e negócios tratam da mesma coisa: ideias importantes, brilhantemente executadas. Lutar pela perfeição, entretanto, é nobre e sério. O truque, como todos os artistas sabem, é entender quais batalhas travar.”

Na arte, dizem que não há mais nada a ser feito desde que Marcel Duchamp enviou um urinol ao Salão de Paris, em 1917. Mas os artistas continuam inovando e criando algo novo. Neste mundo atual em que muito conteúdo, informações, objetos, negócios são produzidos, como podemos manter nossa curiosidade ativa para criar algo novo? E como captar as tendências?

Estamos vivendo em um momento incrível de fluxo e reflexão. Tudo está sendo reavaliado e reconsiderado. Novas histórias estão sendo escritas que serão a base para novos futuros. Este é “O Momento” para ser curioso. As conversas fluem, e o futuro está mais imprevisível do que nunca. Cada um de nós tem a oportunidade de fazer uma contribuição duradoura e útil para uma narrativa global em rápida evolução. Não consigo imaginar um momento mais emocionante para estar vivo, com tantas possibilidades de criar algo novo e melhor. Os artistas nos ensinam que precisamos ser sensíveis. A vida é frágil, os negócios são frágeis. Aqueles que têm sucesso em qualquer área da vida profissional o conseguem graças a sua aguda sensibilidade.

Executivos/líderes precisam buscar referências externas — muitas vezes fora do trabalho — para obter inspiração, assim como os artistas. Que lições os artistas podem ensinar aos executivos sobre procurar inspiração fora de seu trabalho?

Você pode encontrar inspiração em qualquer lugar. O truque é estar pronto. Em última análise, a natureza tem todas as respostas — a natureza é a maior criação que conhecemos. Portanto, eu olharia para aqueles artistas que observam a natureza — como a pintora brasileira Beatriz Milhazes — e estudaria seu trabalho. Olhe, realmente olhe, e você será inspirado, eu prometo!

Quais são as principais lições que os artistas podem ensinar aos gerentes, líderes e empreendedores?

Uma ideia original não existe. Todas as ideias têm uma origem. Paul Cézanne, o grande pintor pós-impressionista francês, disse sobre suas inovações criativas radicais que eram apenas “mais um elo na corrente”. É libertador perceber que todas as ideias estão ligadas ao passado, tendo sido adaptadas à situação presente, a fim de criar algo importante para o futuro.

Você poderia sugerir cinco obras de arte que todo gerente deveria conhecer?

Vamos lá: Les Demoiselles d’Avignon, de Pablo Picasso; Judite decapitando Holofernes, de Artemisia Gentileschi; Fonte (mictório), de Marcel Duchamp; Notary, de Jean-Michel Basquiat e As Duas Fridas, de Frida Kahlo.

Jornalista formada pela Faculdade Cásper Líbero e mestre em Artes visuais pelo Instituto de Artes da UNESP, já escreveu para veículos como Folha de S.Paulo, NeoFeed, Metrópoles, O Estado de S. Paulo, revistas GOL e Veja São Paulo. Trabalhou na curadoria de exposições no MAM São Paulo e no CCSP.