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Do estágio à liderança com Diego Cidade, da Academia do Universitário

Carioca e cursando Economia, ele não conseguia um estágio; depois de formado, resolveu assumir como missão de vida ajudar empresas e estudantes a se conectarem com a Academia do Universitário

Bruno Capelas
21 de julho de 2022
'Quem não fomenta estágio não forma futuros líderes': um papo com Diego Cidade, da Academia do Universitário
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Quando estava na faculdade de Economia, Diego Cidade não tinha dinheiro para fazer cursos e se capacitar para concorrer a uma vaga de estágio numa multinacional ou no mercado financeiro. Acabou indo trabalhar numa clínica de medicina e, de lá, descobriu a vontade de empreender para ajudar outros jovens na mesma condição que ele a chegarem ao mundo do trabalho. 

Foi aí que nasceu a Academia do Universitário, HRtech que ajuda companhias a formatarem seus programas de estágio e contratarem os melhores universitários disponíveis. No papo a seguir, Diego fala sobre essa trajetória e dá dicas para as empresas que querem entender como lidar com a geração Z, em um equilíbrio fino entre ter empatia e dar responsabilidades para os novatos. 

ra algo que estava começando na época. Fui parar num consultório de medicina integrativa no Leblon, que atendia políticos, empreendedores, altos executivos. A ideia era montar programas de vida saudável para esse público, e eu me interessei por empreendedorismo.

Nesse meio tempo, conheci um cara que fazia cursos para grandes empresas, de temas como Python, Excel, Liderança e Negociação – e ele estava interessado em levar esses cursos para as universidades, por uma fração do preço. Eu comecei a ajudá-lo e, quando fui demitido, decidi embarcar com ele no projeto, que acabou virando a Academia do Universitário. A gente começou vendendo cursos, mas logo no início nos aproximamos da Fábrica de Startups, uma aceleradora aqui do Rio de Janeiro, e entramos no programa deles.

Ao final do programa, nós recebemos um investimento – e esses investidores nos provocaram a mudar o foco do negócio, virando B2B, ajudando as empresas a selecionarem os melhores estagiários, que a gente chama de #SuperEstags. Hoje, a gente é uma HRtech, ajudando as empresas a recrutarem, com um método nosso – sendo transparente e trazendo muito conteúdo para o candidato conhecer as empresas e os líderes. Já ajudamos empresas como Neon, Elo e Total Energy. Mas no fim, é isso: começou da minha dor de não conseguir um estágio e acabou me moldando para o empreendedorismo. 

Segundo dados da Associação Brasileira de Estágios, menos de 10% dos universitários brasileiros têm um estágio. Por que isso acontece? 

Em muitas carreiras, o estágio não é obrigatório. Além disso, muitas empresas não ligam para os estagiários, o que é um desperdício: o estágio é a porta de entrada mais importante, de onde você consegue desenvolver as pessoas e incubar a cultura desde o início da carreira de alguém. Quem não fomenta estágio não forma os futuros líderes de uma empresa.

Tem empresas, especialmente as pequenas, que tiveram experiências ruins no passado e decidiram não tentar mais – mas muitas vezes, essas experiências foram erro da própria empresa, como não ter um programa robusto ou não saber recrutar a pessoa certa. Além disso, a lei do estágio é um pouco confusa, na minha opinião. Muita gente entende que você pode ter só dez estagiários na empresa, mas você pode ter dez estagiários de ensino superior a cada gestor. Muitas faculdades não têm uma ligação direta com o mundo do trabalho também – no máximo, elas usam a empregabilidade como um indicador de sucesso. 

O estágio é a porta de entrada mais importante, de onde você consegue desenvolver as pessoas e incubar a cultura desde o início da carreira de alguém.

Uma frase que muitos gestores usam para evitar ter um estagiário é dizer que “não tem tempo para treinar”. Todo mundo precisa de um tempo de rampagem, claro, mas há formas de acelerar isso?

Hoje, eu vejo que o tempo médio de rampagem de um estagiário é de pelo menos três meses, mas existem coisas que ajudam. Para a geração Z, é importante que a empresa tenha um bom posicionamento digital sobre a sua cultura. Muita gente ouve falar de uma empresa e vai ver o canal dela no YouTube. Quem consegue desenvolver bem esse aspecto de marca empregadora vai conseguir trazer pessoas mais alinhadas com a cultura, vai vender mais pra dentro e para fora. É um assunto que precisa ser levado mais a sério.

Além disso, é importante que o processo de onboarding seja dedicado aos estagiários, não aquela integração que se faz com qualquer colaborador, independentemente do cargo que ele vai ocupar. E é importante ter políticas internas para ajudar o estagiário, especialmente no que diz respeito a feedback contínuo e reconhecimento. Ter transparência e pontos de contato ajuda muito essa galera nova, que muitas vezes está na primeira experiência profissional.

Agora, é importante dizer: quem diz que não tem tempo para treinar vai ter uma má experiência, mas a culpa não é do estagiário.

'Quem não fomenta estágio não forma futuros líderes': um papo com Diego Cidade, da Academia do Universitário

Encarar a jornada dupla, com aulas, provas e trabalho, é um desafio para qualquer estagiário. Agora, com o retorno das aulas presenciais, isso fica ainda mais difícil. Como a empresa pode ajudar e ser flexível nesse momento?

Empatia é a chave aqui. As empresas têm que respeitar os momentos de provas e, se for possível, abrir possibilidades de flexibilizar os horários. Além disso, é importante entender que tem muita gente indo para aula presencial pela primeira vez, é um momento de ansiedade para todo mundo. Ter respeito e empatia ajuda muito. 

Uma reclamação comum de estagiários sobre vagas são requisitos exigentes, como ser fluente em um determinado idioma. No entanto, algumas vagas realmente necessitam disso. Como o RH pode equilibrar essa demanda de uma forma justa?

 É um dilema que muitas empresas vivem. Tem companhias que colocam o estagiário para lidar com um gestor internacional, por exemplo, então não tem o que fazer: a vaga tem que pedir domínio do inglês mesmo. A empresa está dando uma oportunidade para quem está capacitado. Mas o que a gente costuma fazer é questionar a empresa que faz um programa de estágio se todas as vagas precisam de inglês – e muitos gestores têm sido pró-ativos em entender que não precisa. É uma consciência super importante. Além disso, as empresas têm também cada vez mais a visão de capacitar dentro de casa, o que é bem legal. 

Muita gente bate na tecla que a Geração Z vai trazer demandas diferentes para as empresas. Por outro lado, talvez as demandas sejam as mesmas de sempre: aprendizado, impacto, equilíbrio entre vida e trabalho e uma remuneração legal. O que muda, de fato, na sua opinião? 

Nem todo mundo quer ser streamer ou tiktoker, de fato: a geração Z quer muito a estabilidade. Muitos pais dessa geração estão endividados, a situação da educação financeira no Brasil é um caos, então quem está chegando agora ao mercado de trabalho quer ajudar a família e ter uma carreira sólida. Por outro lado, acho que a geração Z puxa mais a questão do impacto. Eles não querem só fazer algo bom, mas querem entender de fato o que estão fazendo e as mudanças que vão gerar no mundo.

Um exemplo que eu ouvi: muita gente se nega a ir trabalhar numa empresa petroleira, porque hoje elas são uma das maiores poluidoras do mundo. E o que eu respondi é que a mudança precisa das pessoas, precisa da geração Z, para acontecer. Se vocês que são bons não entrarem para fazer a transição energética, o impacto não vai acontecer mesmo. E para responder a essas demandas, as empresas precisam estar prontas para absorver essa geração.

É preciso fomentar a integração geracional, não achar que só os mais velhos têm solução para tudo. É preciso criar ambientes para que o estagiário esteja na resolução de problemas, que ele faça parte de entregas relevantes. É preciso dar responsabilidades para os estagiários, subir mesmo o sarrafo. Quem não fizer isso e deixar o estagiário só para o operacional provavelmente vai ver taxas de turnover altas – ou corre o risco de, no futuro, efetivar um analista com baixo desempenho.  

É preciso fomentar a integração geracional, não achar que só os mais velhos têm solução para tudo.

Para fechar, você indica algum livro para quem está se preparando para lidar com estagiários hoje em dia? 

Eu gosto muito do Zconomy: como a geração Z vai mudar o futuro dos negócios – e o que fazer diante disso, do Jason Dorsey. É um bom livro que traz comparativos entre as gerações e como a geração Z se comporta no mundo do trabalho, dá dicas para as empresas de como começar essa relação com o pé direito e aproveitar o potencial a longo prazo. Acho que tem tudo a ver com o que a gente conversou aqui.  

Bruno Capelas é jornalista. Foi repórter e editor de tecnologia do Estadão e líder de comunicação da firma de venture capital Canary. Também escreveu o livro 'Raios e Trovões – A História do Fenômeno Castelo Rá-Tim-Bum'.