Especialista em felicidade corporativa discute a importância das empresas pensarem no bem-estar dos colaboradores, valorizando relações de trabalho e equilíbrio entre vida pessoal e profissional

Quando estava na faculdade de Economia, Diego Cidade não tinha dinheiro para fazer cursos e se capacitar para concorrer a uma vaga de estágio numa multinacional ou no mercado financeiro. Acabou indo trabalhar numa clínica de medicina e, de lá, descobriu a vontade de empreender para ajudar outros jovens na mesma condição que ele a chegarem ao mundo do trabalho.
Foi aí que nasceu a Academia do Universitário, HRtech que ajuda companhias a formatarem seus programas de estágio e contratarem os melhores universitários disponíveis. No papo a seguir, Diego fala sobre essa trajetória e dá dicas para as empresas que querem entender como lidar com a geração Z, em um equilíbrio fino entre ter empatia e dar responsabilidades para os novatos.
ra algo que estava começando na época. Fui parar num consultório de medicina integrativa no Leblon, que atendia políticos, empreendedores, altos executivos. A ideia era montar programas de vida saudável para esse público, e eu me interessei por empreendedorismo.
Nesse meio tempo, conheci um cara que fazia cursos para grandes empresas, de temas como Python, Excel, Liderança e Negociação – e ele estava interessado em levar esses cursos para as universidades, por uma fração do preço. Eu comecei a ajudá-lo e, quando fui demitido, decidi embarcar com ele no projeto, que acabou virando a Academia do Universitário. A gente começou vendendo cursos, mas logo no início nos aproximamos da Fábrica de Startups, uma aceleradora aqui do Rio de Janeiro, e entramos no programa deles.
Ao final do programa, nós recebemos um investimento – e esses investidores nos provocaram a mudar o foco do negócio, virando B2B, ajudando as empresas a selecionarem os melhores estagiários, que a gente chama de #SuperEstags. Hoje, a gente é uma HRtech, ajudando as empresas a recrutarem, com um método nosso – sendo transparente e trazendo muito conteúdo para o candidato conhecer as empresas e os líderes. Já ajudamos empresas como Neon, Elo e Total Energy. Mas no fim, é isso: começou da minha dor de não conseguir um estágio e acabou me moldando para o empreendedorismo.
Em muitas carreiras, o estágio não é obrigatório. Além disso, muitas empresas não ligam para os estagiários, o que é um desperdício: o estágio é a porta de entrada mais importante, de onde você consegue desenvolver as pessoas e incubar a cultura desde o início da carreira de alguém. Quem não fomenta estágio não forma os futuros líderes de uma empresa.
Tem empresas, especialmente as pequenas, que tiveram experiências ruins no passado e decidiram não tentar mais – mas muitas vezes, essas experiências foram erro da própria empresa, como não ter um programa robusto ou não saber recrutar a pessoa certa. Além disso, a lei do estágio é um pouco confusa, na minha opinião. Muita gente entende que você pode ter só dez estagiários na empresa, mas você pode ter dez estagiários de ensino superior a cada gestor. Muitas faculdades não têm uma ligação direta com o mundo do trabalho também – no máximo, elas usam a empregabilidade como um indicador de sucesso.
O estágio é a porta de entrada mais importante, de onde você consegue desenvolver as pessoas e incubar a cultura desde o início da carreira de alguém.
Hoje, eu vejo que o tempo médio de rampagem de um estagiário é de pelo menos três meses, mas existem coisas que ajudam. Para a geração Z, é importante que a empresa tenha um bom posicionamento digital sobre a sua cultura. Muita gente ouve falar de uma empresa e vai ver o canal dela no YouTube. Quem consegue desenvolver bem esse aspecto de marca empregadora vai conseguir trazer pessoas mais alinhadas com a cultura, vai vender mais pra dentro e para fora. É um assunto que precisa ser levado mais a sério.
Além disso, é importante que o processo de onboarding seja dedicado aos estagiários, não aquela integração que se faz com qualquer colaborador, independentemente do cargo que ele vai ocupar. E é importante ter políticas internas para ajudar o estagiário, especialmente no que diz respeito a feedback contínuo e reconhecimento. Ter transparência e pontos de contato ajuda muito essa galera nova, que muitas vezes está na primeira experiência profissional.
Agora, é importante dizer: quem diz que não tem tempo para treinar vai ter uma má experiência, mas a culpa não é do estagiário.
Empatia é a chave aqui. As empresas têm que respeitar os momentos de provas e, se for possível, abrir possibilidades de flexibilizar os horários. Além disso, é importante entender que tem muita gente indo para aula presencial pela primeira vez, é um momento de ansiedade para todo mundo. Ter respeito e empatia ajuda muito.
É um dilema que muitas empresas vivem. Tem companhias que colocam o estagiário para lidar com um gestor internacional, por exemplo, então não tem o que fazer: a vaga tem que pedir domínio do inglês mesmo. A empresa está dando uma oportunidade para quem está capacitado. Mas o que a gente costuma fazer é questionar a empresa que faz um programa de estágio se todas as vagas precisam de inglês – e muitos gestores têm sido pró-ativos em entender que não precisa. É uma consciência super importante. Além disso, as empresas têm também cada vez mais a visão de capacitar dentro de casa, o que é bem legal.
Nem todo mundo quer ser streamer ou tiktoker, de fato: a geração Z quer muito a estabilidade. Muitos pais dessa geração estão endividados, a situação da educação financeira no Brasil é um caos, então quem está chegando agora ao mercado de trabalho quer ajudar a família e ter uma carreira sólida. Por outro lado, acho que a geração Z puxa mais a questão do impacto. Eles não querem só fazer algo bom, mas querem entender de fato o que estão fazendo e as mudanças que vão gerar no mundo.
Um exemplo que eu ouvi: muita gente se nega a ir trabalhar numa empresa petroleira, porque hoje elas são uma das maiores poluidoras do mundo. E o que eu respondi é que a mudança precisa das pessoas, precisa da geração Z, para acontecer. Se vocês que são bons não entrarem para fazer a transição energética, o impacto não vai acontecer mesmo. E para responder a essas demandas, as empresas precisam estar prontas para absorver essa geração.
É preciso fomentar a integração geracional, não achar que só os mais velhos têm solução para tudo. É preciso criar ambientes para que o estagiário esteja na resolução de problemas, que ele faça parte de entregas relevantes. É preciso dar responsabilidades para os estagiários, subir mesmo o sarrafo. Quem não fizer isso e deixar o estagiário só para o operacional provavelmente vai ver taxas de turnover altas – ou corre o risco de, no futuro, efetivar um analista com baixo desempenho.
É preciso fomentar a integração geracional, não achar que só os mais velhos têm solução para tudo.
Eu gosto muito do Zconomy: como a geração Z vai mudar o futuro dos negócios – e o que fazer diante disso, do Jason Dorsey. É um bom livro que traz comparativos entre as gerações e como a geração Z se comporta no mundo do trabalho, dá dicas para as empresas de como começar essa relação com o pé direito e aproveitar o potencial a longo prazo. Acho que tem tudo a ver com o que a gente conversou aqui.
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