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Como o Grupo Haganá incorporou a felicidade à rotina de mais de 15 mil colaboradores

Com quase três décadas de existência, empresa do ramo da segurança acaba de contratar diretora de felicidade; objetivo é colocar a saúde e o bem-estar dos milhares de colaboradores no centro da estratégia do negócio.

Maria Clara Dias
1 de março de 2024
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A correlação entre bem-estar e a permanência de colaboradores em uma empresa já é uma velha conhecida no universo do RH. O que há de novo, porém, é o destaque dado ao tema graças a um cargo em ascensão nas empresas brasileiras: o de Chief Happiness Officer (CHO), ou simplesmente Diretor de Felicidade. Responsável por zelar, entre outros temas, pela segurança psicológica e pela saúde mental dos colaboradores, esse profissional já aparece no organograma de empresas badaladas, como o grupo Heineken e a grife Chilli Beans. 

Mas, aos poucos, a felicidade corporativa – com direito a áreas dedicadas e cargos exclusivos – também começa a chegar entre empresas mais tradicionais. É o caso do Grupo Haganá, que atua em serviços como segurança patrimonial, limpeza e portaria: no final de 2023, o grupo também contratou sua primeira diretora de felicidade.

“Havia uma preocupação clara da alta liderança de que, sem o foco no bem-estar e na felicidade de tantos funcionários, o negócio não teria futuro”, conta Ana Carolina Rangel, diretora de felicidade do Grupo Haganá, que chegou à empresa para comandar a área que deve impactar milhares de pessoas — emprega cerca de 15 mil pessoas no país. A chegada de Ana Carolina, há seis meses, fez o Grupo passar a abordar em maior profundidade os temas de saúde mental e incorporar de vez o bem-estar dos colaboradores como parte da estratégia de negócio e gestão de pessoas.

Cuidar de pessoas é o único caminho para o futuro, e as lideranças estão cientes disso.

Na entrevista a seguir para a seção Como Faz, Ana Carolina fala sobre a experiência à frente da recém-criada área, explica os esforços em difundir um conceito tão amplo como o de felicidade e explicita os desafios de coordenar uma verdadeira reestruturação em uma companhia que emprega milhares de pessoas de diferentes regiões e atributos culturais. Além disso, ela também dá dicas a quem pretende incorporar a felicidade dos colaboradores à estratégia de negócio, bem como implementar os primeiros passos para tal.

Como foi o seu primeiro contato com o tema “felicidade” no universo corporativo?

Sou formada em jornalismo e em história. Trabalhei em grandes redações como a Folha de São Paulo e Veja, onde era verdadeiramente apaixonada pelo que fazia. Meu primeiro contato com a felicidade foi, na verdade, nesse período. Fazendo um jornalismo “de serviço” em economia, sentia que podia ajudar as pessoas a entenderem questões básicas do dia a dia, como declaração de imposto de renda e como consultar o pagamento do INSS, por exemplo. Era gratificante.

Depois, tive contato com a comunicação corporativa em uma experiência na Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM). Ali, a parte que me encantava era a comunicação com os colaboradores. Contar suas histórias e passar a se preocupar com a valorização de cada um deles era o que eu realmente gostava.

Em 2020, deixei a empresa para realmente me dedicar à comunicação corporativa, prestando consultoria. Também fui fazendo uma série de movimentos profissionais para me especializar em áreas como psicologia positiva, ciência comportamental, yoga, entre muitas outras coisas. Nessa época, concluí ainda minha formação em Chief Happiness Officer, algo que reuniu toda a minha bagagem profissional, da clareza da importância dos canais de comunicação com o colaborador à escuta ativa e o cuidado com as pessoas.

E quando foi que o Grupo Haganá entrou na história?

Após três anos atuando de forma independente como consultora, e depois de muitos estudos, eu estava aberta a novas possibilidades. A ponte com o Grupo Haganá veio depois da publicação deles em busca de um CHO. Meu primeiro pensamento foi de dúvida: afinal, o que uma empresa de segurança poderia querer com o tema da felicidade? Qual era a relação? Mas decidi arriscar, enviar meu currículo e entender mais a fundo. Participei de conversas com o Diretor de Pessoas e a partir dali todos os vieses que eu tinha sobre o setor de segurança foram desconstruídos. 

Como assim?

Sempre acreditamos que a área de segurança não preza pelo bem-estar dos funcionários, principalmente pela percepção de que grande parte das empresas contratadas para esse fim são terceirizadas. Mas, no Haganá, percebi que a felicidade, saúde mental e bem-estar físico de todo mundo envolvido no negócio seria uma prioridade de agora em diante.

Em algumas empresas que já abordam o assunto, os cuidados com a felicidade entram na seara do RH, por se tratar de um esforço em prol de bem-estar e capital humano. Como uma pessoa que vem da área da comunicação, como foi o processo pelo qual você passou para assumir o cargo de diretora de felicidade, mesmo não sendo da área de gestão de pessoas?

No meu caso, a formação como Chief Happiness Officer é o que me aproximava do cargo. Também já fui líder no passado, e tenho um MBA que me preparou para a gestão de pessoas. Não ser do RH nunca foi um impeditivo, pois hoje a diretoria de felicidade responde diretamente ao CEO. Sem dúvida, trabalho muito próxima do RH, pois preciso de parceiros que ajudem a levar a mensagem adiante. Assim também é como acontece com todas as áreas da empresa.

Qual foi a motivação do Grupo Haganá para criar, em 2023, a diretoria de felicidade?

O que percebi foi não apenas uma preocupação, mas um interesse genuíno com o bem-estar dos colaboradores. E é uma coisa que vem com o tempo na própria empresa. Muitos colaboradores estão na companhia desde a fundação, há 27 anos. Essa preocupação em estar lado a lado, entendendo as necessidades dos colaboradores e ouvindo o que eles têm a dizer, principalmente para a construção de uma jornada conjunta de sucesso, é algo muito presente na empresa. A criação da diretoria de felicidade vem para consolidar isso.

Essa é também a mesma justificativa para o fato de se dedicar mais ao tema, ora ou outra abordado por empresas mais “descoladas”, mesmo sendo uma empresa mais tradicional. É importante para o Haganá fazer parte desse movimento?

Depois de 27 anos, o Grupo Haganá continua crescendo. E com essa percepção de que é preciso uma relação saudável com os funcionários para continuar nesse ritmo, surgiu a preocupação de que, sem uma pessoa dedicada a isso, logo não seria possível cuidar de tanta gente. Porque uma coisa é alcançar mil funcionários em uma fábrica. Outra coisa é falar com 15 mil pessoas em todo o país, em diferentes regiões, locais e realidades.

A felicidade não deve ser responsabilidade de um departamento específico, mas uma cultura linear.

Agora, é uma questão de conseguir espalhar o propósito, unificar a cultura e manter todos engajados e com qualidade de trabalho. E o que vemos é que essa é uma preocupação de todo tipo de empresa, principalmente após a pandemia. Cuidar de pessoas é o único caminho para o futuro, e as lideranças estão cientes disso. No Haganá, por exemplo, havia uma preocupação clara da alta liderança de que, sem o foco no bem-estar e na felicidade de tantos funcionários, o negócio não teria futuro.

A felicidade em si é um conceito bem amplo, e gerenciar isso deve ser tão complexo quanto. Você mencionou que é um trabalho multidisciplinar e que também depende do envolvimento de várias áreas. Nesse sentido, quais têm sido as suas prioridades no cargo desde que assumiu?

Sem dúvida, formar novas pessoas dentro da empresa que apoiem o tema da felicidade é a principal tarefa nesse momento. Juntas, essas pessoas vão atuar como embaixadores da felicidade, ajudando a ecoar o assunto. Nossa primeira turma se formou recentemente, e a outra se formará em março. Aprimorar os muitos programas que já existiam também, como o conselho de ética e os próprios canais de compliance e comunicação. Outra prioridade é o treinamento contínuo da liderança, pois entendemos que eles são multiplicadores, e devem manter uma conduta muito próxima ao que queremos entregar. Sem isso, o projeto de felicidade não avançaria.

Quais têm sido os principais desafios e aprendizados de implementar o tema de felicidade, além de coordenar essa nova área?

O principal desafio, sem dúvida, é chegar até 15 mil pessoas. É algo desafiador falar em bem-estar e gerar uma sensação de pertencimento a pessoas que muitas vezes estão distantes fisicamente da sede da empresa. A cultura é essencial para ampliar o tema, e por isso estamos criando os embaixadores, para reduzir a distância entre a central e quem está na ponta. Também há o desafio da instrução. Muitas vezes, a felicidade no trabalho é um conceito difícil de explicar, até mesmo pela amplitude do assunto. Mas, quando falamos de funcionários que atuam em diferentes níveis, escalas de trabalho, regiões e que têm diferentes realidades socioeconômicas, vemos muitas vezes a dificuldade em entender seus direitos, benefícios e os pilares da saúde do trabalho. Por fim, mensurar felicidade é sempre um desafio também (risos).

E por falar em mensurar a felicidade corporativa, há alguma maneira de identificar facilmente os casos onde a insatisfação e a queda de produtividade são, de fato, resultado da infelicidade no trabalho? Ao invés de alguma decepção momentânea. Qual é a fórmula das empresas e dos colaboradores para decifrar esse conceito tão amplo?

Quando você deixa de sentir que seu trabalho faz sentido e não te traz satisfação ou retornos imediatos. Quando falamos de felicidade corporativa, também buscamos entender se é possível ver significado no trabalho. Um outro indício é o medo de repassar as mensagens ou fazer trocas diretas com a liderança, o que cria equipes inseguras que repassam a “tarefa” de falar com os chefes. Na área de felicidade, defendemos a liderança positiva, na qual os líderes se comunicam com o colaborador, dando feedbacks positivos ou negativos. Porque o importante é prezar pela comunicação e pela construção de uma relação de confiança.

Que dicas você daria para empresas que, assim como o Haganá, estão estruturando suas próprias áreas de felicidade ou, ainda, começando agora a olhar para esse tema?

Diria que é uma decisão que vem da alta liderança. Sem o comprometimento da diretoria, não é possível criar nenhum pilar. Um outro conselho seria contar com o RH, mas também ter parceiros de fora dali, que possam ajudar no processo. Sinto que esse modelo de trabalho da área  — desprendida de um departamento específico, mas respondendo a todos  — gera mais confiança dos colaboradores. Eles se sentem à vontade para compartilhar suas opiniões e feedbacks. A felicidade não deve ser responsabilidade de um departamento específico, mas uma cultura linear.

Jornalista de negócios, empreendedorismo e tecnologia. Passou por publicações como Exame, Época Negócios e Autoesporte, além de colaborar com reportagens especiais para a Gazeta do Povo. É vencedora do Prêmio de Destaque em Franchising na categoria Jornalismo de Revista pela ABF em 2022.