Estudo da Cia. de Estágios mostra que estudantes priorizam flexibilidade e desenvolvimento profissional na hora de escolher uma vaga; entender público jovem é vital para o RH entender futuro das organizações
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A infinidade de fatores que influenciam a definição do salário de um colaborador é algo com o que o RH já está bem familiarizado. Do piso instituído por entidades de classe e a comparação constante com concorrentes do mercado ao desejo de profissionais por pacotes de remuneração que vão além da folha de pagamento, atender à complexidade de detalhes envolvendo a quantia recebida todo mês é um dos principais desafios das empresas. Na gigante brasileira de cosméticos Natura&Co, esse desafio chegou a um novo patamar: o salário agora também tem de seguir o propósito da sustentabilidade e igualdade social.
Em 2020, a companhia lançou mão do Visão 2030, conjunto de medidas a serem adotadas até 2030, com o objetivo de tornar o grupo mais próximo do desenvolvimento sustentável. Uma dessas ações é o programa Renda Digna, que estabelece novas diretrizes na definição da remuneração de todos os colaboradores na América Latina. Na prática, a empresa resolveu abandonar as bases estabelecidas pelos governos locais (os chamados salários mínimos), e criar sua própria definição de “mínimo” a ser pago por uma jornada de trabalho. Por trás da definição da renda digna, estão uma série de parâmetros que incluem, entre outros fatores, o custo de vida por região e os valores necessários para se ter acesso à saúde, educação, transporte e saneamento básico.
O pagamento de renda digna é a porta de entrada para a garantia do bem-estar e esse programa é um dos pilares centrais da nossa estratégia de regeneração social.
Quem faz a afirmação acima é Gleycia Leite, diretora de compensação, organização e gestão da Natura. O propósito, segundo ela, é oferecer um salário compatível com as necessidades de cada funcionário, considerando estilo de vida, cargo e local de trabalho. É algo que vale para todos: das comunidades extrativistas responsáveis pelo plantio e colheita das matérias-primas utilizadas em perfumes e loções até a alta liderança. Além da renda digna, a estratégia de regeneração social da Natura também compreende a equidade de gênero e salarial — a companhia afirma ter acabado com as diferenças salariais entre homens e mulheres na América Latina.
Na entrevista a seguir, Gleycia explica a motivação da companhia em adotar novos indicadores para remuneração, além de detalhar o passo a passo do processo de implementação dos novos “salários dignos” para seus mais de 16 mil colaboradores na região. A executiva também aborda os desafios de estabelecer a nova política salarial em diferentes regiões e culturas e como tudo isso traduz as ambições da Natura&Co de se tornar uma empresa-modelo quando o assunto é ESG. “Temos a visão holística de que a renda digna não deriva de um olhar de competitividade salarial, mas na crença de que todos os indivíduos têm o direito à uma vida próspera, pertencente e com propósito”, diz ela.
Em 2020, nos comprometemos com a Visão 2030, também conhecida como “Compromisso com a Vida”. Dentro desse prazo de 10 anos, o plano traz uma série de compromissos e ações para abordar algumas das questões mais urgentes do mundo: enfrentar a crise climática e proteger a Amazônia, garantir igualdade e inclusão, e mudar nossos negócios para circularidade e regeneração.
Para cada uma dessas questões, a Natura traçou metas e, a partir desse desdobramento foi definida especificamente a meta de garantir salário digno para todos os colaboradores. Vale ressaltar que, a métrica de Renda Digna também é umas das principais metodologias utilizadas no IP&L, uma ferramenta lançada em 2022 que monetiza o impacto do negócio no capital humano, social e ambiental. A partir da meta, criamos uma metodologia tendo como base os dados da organização global Wage Indicator Foundation, que pesquisa e coleta informações sobre a renda digna em mais de 140 países. Este cálculo é adaptado por país e região já que o custo de vida varia por localidade.
No Brasil são poucas as iniciativas que consideram o padrão de dignidade para criar faixas salariais. A Natura &Co, no entanto, está uns passos à frente nesse quesito, pois integramos o Movimento Salário Digno do Pacto Global da ONU Brasil. A iniciativa é baseada em quatro pilares estratégicos: engajar a alta liderança; oferecer a construção de capacidades, por meio de lives, workshops, treinamentos e conteúdos sobre o tema; engajar os stakeholders e o monitorar e compartilhar as nossas boas práticas.
Vivemos em um cenário marcado pelo distanciamento sistemático entre o homem e a natureza, e por um crescente desequilíbrio social. Isso tudo manifesta significativas desigualdades no acesso a direitos fundamentais. Sendo assim, surge a necessidade de uma agenda de impacto mais transformacional por parte dos negócios, uma agenda baseada na regeneração. Aqui está o ponto de ir além do operacional do RH.
O programa de renda digna é um dos pilares centrais da nossa estratégia de regeneração social. Para nós, a regeneração social é um processo de renovação positiva da sociedade através da transformação dos valores, do propósito das instituições e das interações sociais de maneira que cada indivíduo tenha a possibilidade de suprir seu próprio bem-estar, e contribuir para o bem-estar daqueles ao seu redor. O pagamento de renda digna é a porta de entrada para a garantia do “Bem Estar Bem”. Além da renda digna, a estratégia de regeneração social ainda conta com os pilares de educação, saúde e bem-estar, cidadania e diversidade.
A Natura&Co adotou a referência de salário digno fornecida pela Wage Indicator Foundation, baseada no custo de vida em diferentes regiões do Brasil e América Hispânica. A renda digna é calculada considerando todas as necessidades essenciais, indo além do salário-mínimo governamental. Ela é calculada com base em uma pesquisa de custo de vida local e o que é necessário para um nível de vida decente, em um determinado lugar e em jornadas normais de trabalho. Isso inclui a possibilidade de acesso à alimentação, água, habitação, educação, saúde, transporte, vestuário e outras necessidades essenciais, além de provisão para situações inesperadas.
A meta de salário digno abrange toda a nossa operação na América Latina. Logo, nosso desafio foi o de olhar a granularidade do custo de vida em todos os países em que atuamos. No caso do Brasil, por exemplo, esse esforço é muito maior pois cada região tem suas peculiaridades e isso precisa ser considerado.
Mas além da questão territorial, destacamos a periodicidade que coletamos essa informação. Em um país como a Argentina, por exemplo, com a alta pressão inflacionária, não podemos olhar para essas informações uma vez por ano e achar que está tudo bem. É preciso uma análise contínua e trimestral. Fomos, então, buscar dados baseados em pesquisas de custos de vida que tivessem essa granularidade e periodicidade que nos permitisse avaliar o que seria o salário digno para além daquele mínimo governamental, que geralmente é adotado como referência.
A partir do momento em que declaramos esse nosso compromisso, é importante assegurar sua gestão, já que ele é aplicado no dia a dia da nossa operação. Então, da mesma forma que acompanhamos receita, venda e outros ativos da empresa, é relevante ter um instrumento que me permita monitorar e tomar decisões sobre o estabelecimento desse salário digno.
Ao longo dos últimos três anos, tivemos aprendizados importantes enquanto trabalhávamos para alcançar essa meta. A importância de ter um compromisso claro e alinhado com a Visão 2030 foi fundamental para impulsionar ações concretas em direção aos objetivos estabelecidos. Já na fase em que desenvolvemos a metodologia com base nos dados da Wage Indicator Foundation, aprendemos a reconhecer e nos adaptar às diferentes realidades locais em que a empresa opera. Isso foi essencial para garantir que as políticas e práticas de remuneração fossem justas e adequadas em todas as regiões.
Com isso, fomos capazes desenvolver métricas robustas que tivessem granularidade suficiente para respeitar essas diferenças e ter coerência. Uma das metodologias utilizadas foi a Integrated Profit & Loss Accounting (IP&L ou Contabilidade Integrada de Lucros e Perdas), lançada em 2022 e que consegue mensurar e monetizar o impacto dos negócios nos capitais humano, social e ambiental.
De fato, adotar uma renda digna é mais do que uma simples prática de remuneração.É um compromisso com os valores fundamentais de dignidade humana e equidade, além de ser um passo significativo em direção à incorporação de diretrizes ESG. Acreditamos que as empresas devem assumir uma responsabilidade muito clara na defesa e promoção dos direitos humanos e isso deve acontecer de forma transversal dentro da companhia. O pagamento de renda digna é um pilar central na manutenção desses direitos. Ela é importante não só como meio de subsistência digna, ou seja, de garantia que as pessoas tenham acesso a itens básicos como alimentação, moradia, transporte e lazer, mas como gerador de impacto nas gerações futuras e na própria economia da sociedade.
O salário digno está intrinsecamente ligado às nossas iniciativas para acabar com a desigualdade salarial. É um componente essencial para o cumprimento das metas no segundo pilar da nossa Visão 2030, “Defender os direitos humanos e sermos mais humanos”, aplicando essa premissa em todas as nossas operações. O nosso compromisso com a dignidade humana busca eliminar essas desigualdades, então o letramento das pessoas gera esse entendimento para sairmos das grandes bolhas sociais nas quais podemos estar inseridos. Temos a visão holística de que a renda digna não deriva de um olhar de competitividade salarial, mas na crença de que todos os indivíduos têm o direito à uma vida próspera, pertencente e com propósito. Acreditamos que através de programas e posicionamentos como esse, somos capazes de reduzir as desigualdades e combater as injustiças.
Além de ser uma questão de justiça social, o salário digno reflete o compromisso da empresa com o bem-estar e a valorização dos colaboradores. Evidentemente que, em um mercado de trabalho competitivo, oferecer uma remuneração justa e equitativa torna a empresa mais atrativa para talentos qualificados, contribuindo para a construção de equipes engajadas e comprometidas. Colaboradores que se sentem valorizados e justamente remunerados têm maior probabilidade de permanecer na empresa a longo prazo, reduzindo a rotatividade e promovendo a estabilidade organizacional. Dessa forma, o salário digno não só fortalece o compromisso social de Natura&Co, mas também é um investimento estratégico no crescimento e sucesso sustentável da empresa.
Para nós, garantir renda digna e equidade salarial é uma jornada contínua. Os próximos passos de Natura&Co na jornada da remuneração digna incluem manter a equidade em todas as regiões, atualizar continuamente os critérios de cálculo, avaliar o impacto além dos aspectos econômicos, incluir novos públicos e buscar constantemente por inovação e melhorias. Estas ações são fundamentais para garantir o compromisso da empresa com o bem-estar e a dignidade não apenas de seus colaboradores, mas também das consultoras e das comunidades com as quais ela se relaciona.
Nesse sentido, buscamos fortalecer o desenvolvimento econômico de nossa rede, focando em seus públicos prioritários. Na Visão 2030, ressaltamos nossa meta de aumentar em 10% o Índice de Desenvolvimento Humano das Consultoras e avanços sociais nas comunidades agroextrativistas, por exemplo. O objetivo é gerar impacto mensurável em renda digna, refletindo em saúde, educação e cidadania, ancorado na equidade de gênero e racial.
Com base em toda nossa jornada, acredito ser essencial estabelecer uma visão clara alinhada aos valores da empresa. Em seguida, adaptar-se às diferentes realidades locais e desenvolver métricas eficazes para avaliar o impacto das práticas de remuneração. Essas métricas devem abranger não apenas aspectos econômicos, mas também questões sociais e de bem-estar dos colaboradores.
Por fim, o engajamento em iniciativas sérias sobre o tema pode ser um bom começo para aquelas empresas que estejam pensando em caminhos para propiciar uma remuneração digna a seus colaboradores. O Movimento Salário Digno, por exemplo, tem a credibilidade do Pacto Global e pode oferecer as ferramentas e capacidades necessárias para as companhias atinjam suas metas, além de um ecossistema mais completo e potente para questões relacionadas ao tema e os especialistas e empresas mais influentes no tema para apoiá-las nesta jornada.
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