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6 nomes para acompanhar no Dia da Visibilidade Trans
No país em que mais de 90% desse grupo recorre à prostituição para sobreviver, conheça a trajetória de quem venceu as estatísticas de empregabilidade
Tantos podem ser os motivos para não passar em um processo seletivo de uma vaga, como falta de afinidade com a cultura da empresa, pouca qualificação técnica, currículo inadequado, e por aí vai. Mas e quando a sua identidade se torna a sua maior barreira? Essa é a realidade das pessoas trans e travestis no Brasil, país onde apenas 4% da população trans feminina brasileira encontrou oportunidade em empregos formais, enquanto mais de 90% utiliza a prostituição como fonte primária de renda, segundo números da Antra (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) publicados em 2020.
Ainda, o mapeamento das pessoas trans no município de São Paulo, publicado pelo Centro de Estudos de Cultura Contemporânea (CEDEC) em janeiro de 2021, comprovou as dificuldades dos caminhos para o trabalho formal, além de enfatizar a violência familiar e institucional entre as pessoas que não se identificam com o gênero que lhes foi designado ao nascimento.
Entre as pessoas entrevistadas para o relatório, quase 50% deixou de morar com a família por desentendimento ou expulsão – o que colaborou para um futuro de exclusão. Com uma trajetória de amadurecimento prematuro, muitas delas abandonam os estudos, buscando o mínimo para sobrevivência. Com isso, as atividades relacionadas ao sexo protagonizaram o segundo lugar da pesquisa, sendo a mais exercida entre travestis e mulheres trans.
Mais de 57% das pessoas trans entrevistadas não possuíam formação técnica, sendo o emprego informal, temporário e sem contrato, o principal tipo de vínculo atribuído. De bico em bico, cavando a sobrevivência num país que não favorece qualquer tipo de ascensão para quem vive à margem. Já quando questionadas sobre condições necessárias para trabalhar, os principais pontos cercavam falta de dinheiro para investir em qualificação, menos preconceito e mais vagas.
O Brasil é, ainda, o líder há 13 anos do ranking mundial de assassinatos contra pessoas trans, mapeados pela Transgender Europe. Aliás, segundo relatório de 2022, enquanto a América Latina representou 68% dos casos mundiais, o Brasil assumiu quase ⅓ dos crimes levantados.
Apesar dos números alarmantes, eles poderiam ser ainda mais chocantes. Afinal, o levantamento “LGBTIfobia no Brasil: barreiras para o reconhecimento institucional da criminalização”, publicado em 2021 pela All Out, mostrou 34 barreiras para o reconhecimento da criminalização contra esses grupos. Isso porque ainda inexiste um padrão de registro das ocorrências, falha no reconhecimento do nome social de travestis e pessoas trans, além da identidade de gênero não ser mapeada em censos demográficos do IBGE.
Quem lacra não lucra?
Hoje, buscando um quadro diverso de colaboradores, empresas têm aberto vagas afirmativas para a população trans. E, de acordo com o levantamento da consultoria McKinsey, empresas da América Latina que adotam a diversidade tendem a ser mais inovadoras. A pesquisa conclui que os líderes desses negócios são melhores em promover a confiança, os ambientes de trabalho são mais felizes, a retenção de talentos é maior, e tudo isso se traduz em uma saúde organizacional mais sólida em resultados, com uma probabilidade de performance financeira maior em relação aos concorrentes sem as mesmas práticas de DE&I.
No Dia da Visibilidade Trans, celebrado neste 29 de janeiro, o nosso gole é para inspirar e te contar 6 histórias de nomes que têm mudado o mercado, cravando grandes passos, para que outras pessoas trans, travestis, transvestigêneres e não-binárias, entrem juntes nessa caminhada.
Nathália Fernandes, Analista de Endomarketing na Alcoa
Com experiência em multinacionais e referência para os seus 40 mil seguidores no LinkedIn, Nathália é enfática: “se você me dissesse que isso aconteceria, eu daria risada da sua cara”. Afinal, jornalista pela UFRJ e reconhecida como Top Voice na rede social profissional, ela cravou o seu lugar no mercado. Ainda assim, não se sente blindada pela transfobia.
“Eu tenho muito medo do desemprego. Para além do desemprego relacionado à crise econômica, eu tenho que lidar com o estigma de muitas vezes a vaga existir, o meu perfil ser correspondente, mas eu não ser contratada pelo simples fato de ser uma pessoa trans.”
Esse medo a leva, inclusive, para o início da sua carreira, ainda na busca por estágio. “Ao longo dos processos, me dei conta que até ter a chance de mostrar aptidão, habilidade e conhecimento, existia um pré-requisito que antecedia essa parte, que era a questão performática, de como eu me apresentava.” E assim ela percebeu que quanto mais se afastava de si, mais se podava, mais longe chegava em processos de seleção. Hoje, em todas as suas conquistas, Nathália não imagina um lugar específico, uma posição ou cadeira onde queira chegar, mas ela tem o cenário desenhado: “onde quer que eu esteja, que eu consiga puxar mais pessoas trans e travestis comigo.”
Caê Vasconcelos, Repórter no UOL
Com passagem pela ESPN, Agência Mural e Ponte Jornalismo, Caê se entendeu enquanto homem trans quando produzia o seu TCC. “Transresistência: Pessoas Trans no Mercado de Trabalho” reúne histórias de trans e travestis que fugiram das estatísticas da exploração sexual e encontraram seu lugar no mercado. A obra que começou na faculdade, hoje ganha as prateleiras das livrarias, tendo sido publicada no ano passado pela Dita Livros.
”Como um cara que cresceu numa família que não chegou à universidade nem tinha contatos no jornalismo, nunca pensei que pudesse ser jornalista”, conta. Da sua participação nos atos de junho de 2013, ele entendeu que precisava compartilhar as percepções e pontos de vista de pessoas com ele.
“A trajetória de empregabilidade foi muita paciência e insistência da minha parte. Sempre tive que correr 10x mais que os outros para minimamente ser visto como igual.” Do jornalismo independente a grandes veículos, Caê hoje realiza o que sempre quis: lidar com histórias e pessoas. “As portas que eu estou abrindo, que não sejam só para mim, mas para outras pessoas trans no jornalismo. Acredito que a luta trans só vai ter sucesso quando ela for coletiva.”
Thomas Nader, Supervisor de BP no Mercado Livre
Como gerente de projetos na TODXS e vice-diretor executivo no Projeto Transpor, iniciativas educacionais para empoderamento da comunidade LGBTQIAPN+, a bagagem de Thomas o levou a atuar em RH. Hoje, no Mercado Livre, ele entende que as pessoas precisaram abrir mão de alguns requisitos para a sua entrada. Afinal, formado em Educação Física, ele fez uma transição de carreira antes de iniciar a sua trajetória na área de Gente.
“Estou onde estou hoje porque buscaram conhecer as skills da minha vida”. Thomas acredita que é papel do RH, muitas vezes, influenciar a liderança nesse preenchimento de vagas – para que as empresas conquistem diversidade de verdade. Como LinkedIn Top Voice Orgulho, ele é também palestrante e criador de conteúdo voltado para Diversidade no mundo corporativo.
Lua Mansano, Produtora Audiovisual, Creator e Palestrante
“Travesti, nascida em Ourinhos, positHIVamente viva. E venho construindo esse espaço de coletivização, de reorganização social e fomentando experiências no mercado de trabalho a partir de um aspecto transcentrado – ou seja, com pessoas trans no centro”. Assim, ela se define.
Com passagem pela Mynd, Lua também fundou o TransLinkedIn – iniciativa para mapear pessoas trans da rede e fazer a ponte com RHs e empresas. Com um currículo extenso e uma atuação multidisciplinar, ela acredita que começar a produzir conteúdo para o LinkedIn a ajudou a se reconhecer como profissional, desenvolver novas competências e formas de trabalho, além de conseguir acesso a oportunidades e trocas. Entre apoio a projetos sociais, desenvolvimento de palestras, projetos e ações junto a agências de audiovisual, Lua acredita que o seu diálogo tem “um potencial educativo grande, além de promover oportunidades para outras pessoas trans”.
Eva Pires, Instrutora de dança
Formada em administração e com mais de 10 anos de experiência em empresas tradicionais, Eva deixou o mundo corporativo porque não se sentiria segura de realizar a transição de gênero onde trabalhava. “Eu poderia ficar doente mentalmente. Tenho certeza que, se eu pedisse nome social e chegasse para trabalhar de saia e salto alto, seria o pior dia da minha vida.”
A sua saída para sobreviver foi começar a empreender. De revendedora Avon à instrutora de dança, as aulas de zumba começaram a ser o seu sustento. Hoje, cursando Pedagogia, o seu sonho é se tornar professora. “O mercado de trabalho formal não está preparado para pessoas trans – e a educação é o primeiro passo para a inclusão. A gente sonha, mas sabe que as oportunidades são diferentes. Mesmo investindo numa educação de qualidade, poucas serão aceitas no mercado de trabalho. Por isso trabalho para uma educação antirracista e anti-lgbtfóbica.”
Spencer Jill, Bacharelanda em Engenharia de Produção na UNOPAR
Primeira mulher a trabalhar na Vallourec, multinacional no setor siderúrgico, Spencer sempre frisa em processos que as empresas não estão contratando uma pessoa transexual. “Mas um cérebro que pensa, aprende e executa tarefas em alta precisão. Eu sou capaz de fazer qualquer coisa como qualquer outro colaborador de uma empresa. Então, não quero ser vista como exceção nas empresas.”
Ainda assim, ela reconhece as dores da trajetória das pessoas trans na empregabilidade, principalmente pelos estereótipos relacionados à prostituição. Bacharelanda em Engenharia de Produção, e cursando paralelamente Negócios Internacionais e Comércio Exterior, a dica de Spencer para pessoas trans é a busca de vagas em grandes companhias pela probabilidade de apresentarem programas de diversidade estruturados.
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