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Como fazer o RH e o financeiro falarem a mesma língua

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Sustentabilidade, diversidade e IA: um papo com Patrícia Coimbra, diretora de Gente da Porto

Em meio a turbulência política, executiva defende que é hora de acelerar em pautas como inclusão e preservação ambiental; em junho, empresa assumiu metas para contratação de mulheres e pessoas pretas e pardas, além de investimentos na área social

Gabriela Sá Pessoa
16 de outubro de 2025
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Há pouco mais de um ano, a carioca Patrícia Coimbra viveu uma boa guinada na carreira: deixou a Cielo para chefiar a área de Gente e Cultura da Porto. Aos 57 anos, ela se surpreende com a capacidade de renovação de sua trajetória. “É bom ver que existem desafios muito legais acima dos 50 anos de idade. Refleti muito sobre isso quando fiz essa mudança”, conta a executiva. Além de cuidar da gestão de pessoas, ela também passou a chefiar a agenda de diversidade, inclusão e sustentabilidade da seguradora, conhecida pela sua ligação com temas sociais.

Em junho, a Porto lançou uma nova estratégia de impacto ambiental, social e de governança interna, o programa Regenera. Com ele, a empresa assumiu novas metas públicas em quatro eixos até 2030: capital humano e impacto social, estratégia climática e circularidade, produtos e soluções sustentáveis, e engajamento da cadeia de valor. 

No campo da gestão de pessoas, o programa prevê que a Porto atinja 30% de pessoas negras e 50% de mulheres em cargos de liderança, além do investimento de R$ 40 milhões em projetos sociais, culturais e esportivos. A proposta será apresentada com detalhes em novembro na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025 (COP30), em Belém. 

Responsável por liderar essas iniciativas, Patrícia defende que as ações de diversidade e inclusão devem ser um princípio de gestão. 

Não retrocedemos diante de mudanças políticas ou econômicas. Pelo contrário: aceleramos.

Na entrevista a seguir, além de contar detalhes de sua trajetória – que inclui passagens por empresas como Shell, Oi, Johnson & Johnson e SulAmérica –, a executiva também fala sobre temas quentes, como saúde mental e inteligência artificial. 

Patrícia, como foi sua trajetória acadêmica e profissional? 

Hoje, tenho 57 anos. Fui contratada pela Porto com 56, no ano passado. É bom ver que existem desafios muito legais acima dos 50 anos de idade. Refleti muito sobre isso quando fiz essa mudança

Sou carioca, estou há 8 anos em São Paulo e tenho duas filhas. Sou formada em Tecnologia da Informação pela PUC-RJ e também fiz Economia na Universidade Cândido Mendes. Minha primeira grande escola foi a Shell, no Rio. Lá, mudei de carreira, fui para a área de planejamento estratégico, econômico e financeiro. Depois desse período, fui para a área de RH. Fiquei 13 anos na SC Johnson. Comecei em RH, passei um ano na área comercial, e voltei para a área de Gente. Fiquei dois anos e meio na Oi, só na área de RH. Depois, passei 10 anos na SulAmérica, onde comecei como diretora de RH, e em 2015, passei a ser responsável por Sustentabilidade. Daí, fuipara a Cielo, fiquei 15 meses como vice-presidente de RH e sustentabilidade. E agora estou aqui na Porto, como diretora de Gente e Cultura. 

E aqui [na Porto], estou há um ano e um mês como diretora de Gente e Cultura, cuidando da pauta de RH e também sustentabilidade.

Por que você achou que tinha que fazer uma segunda graduação em Economia? Você poderia ter feito cursos menores, um mestrado ou um MBA. Mas por que resolveu encarar a segunda graduação. E quantos anos você tinha?

Eu tinha 20, 21 anos na época. Estava na Shell, apoiando a área de estratégia com tecnologia. Lembro que me deram 20 livros para ler em inglês sobre fluxo de caixa e fluxo de investimentos e eu achei que não daria conta daquilo. Eu quis fazer a segunda faculdade, ninguém me obrigou. As minhas duas faculdades e a minha pós em marketing foram muito úteis, porque foram muito práticas. Na área de Economia, eu trabalhava com toda a parte de macroeconomia, porque eram grandes indicadores que alimentavam os cenários e as revisões estratégicas dos negócios.

Você chegou na Porto ano passado para liderar a área de Gente e Cultura. Como foi esse convite? E como esse match aconteceu?

Eu estava bem onde estava, mas a empresa [Cielo] estava passando por um processo de fechamento de capital. E, quando a empresa fecha capital, você deixa de trabalhar para o mercado e começa a trabalhar para o dono. Sei fazer isso, mas não é onde eu sou boa. Sou boa na operação e na agenda de acionista. Ao mesmo tempo, minha experiência encaixava bem no desafio da Porto, pois trabalhei com seguros, saúde e meios de pagamento.

O match se deu porque a Porto é uma companhia que valoriza muito as pessoas e seus parceiros. A empresa tem uma governança que toma decisões colegiadas, embasadas e transparentes. É um negócio complexo, que impacta muita gente: são quase 14 mil colaboradores, 46 mil corretores, 13 mil prestadores de serviços e 18 milhões de clientes. É muita responsabilidade. Principalmente, deu match porque aqui o pessoal fala o que é, e eu falo o que é. Não tem aquela coisa politicamente correta.

Quando te contrataram, já existiam as novas metas do Regenera e de diversidade, ou foi algo que você trouxe?

A Porto é uma empresa de 80 anos e sempre trabalhou muito o desenvolvimento das pessoas, do ambiente e da diversidade. Minha chegada vem ajudar nesse processo. Entro num momento em que estamos fortalecendo a governança desta agenda dentro da companhia. Temos a Comissão de Sustentabilidade e a Comissão de Diversidade, que assessoram o Conselho de Administração. Quem toca esta agenda são os executivos e executivas da companhia, apoiados por nós.

Falando do cenário político, fala-se em retrocesso na agenda de diversidade e sustentabilidade, com muitas empresas voltando atrás em compromissos nos últimos meses. Quanto dessa mudança do ambiente global influencia a Porto, e por que é importante manter essas ações?

Nesses 80 anos, a Porto já passou por muitos movimentos. Aqui, estamos acelerando a agenda. Assumimos metas públicas de liderança feminina e de pessoas pretas e pardas. E por quê? Porque essa é a forma como a companhia opera

A agenda de sustentabilidade também é vista como risco e oportunidade de negócio. Enquanto alguns estão [questionando], olhamos se é um risco ou uma oportunidade. Temos que saber onde estamos investindo, quais são os riscos da nossa operação, portfólio de produtos e cadeia de valor. Temos negócios que têm como natureza a circularidade e a reciclagem há 20 anos.

Trabalhei em multinacionais onde tive líderes mulheres, pretos, com deficiência e com diferentes orientações sexuais. E isso me ensinou pelo exemplo.

Falando do Regenera, vocês assumiram o compromisso de investir R$ 40 milhões em projetos sociais, culturais e esportivos. O projeto inclui o compromisso de alcançar 30% de pessoas negras e 50% de mulheres em cargo de liderança. Como está a composição da Porto hoje em dia?

Há mais de 10 anos, a Porto divulga o relatório de sustentabilidade com todos os indicadores. A única coisa que posso adiantar é que estamos próximos, e essa meta é para 2030. Estamos acelerando muito na estruturação dos programas, no entendimento de sucessão, talentos, entradas e promoções, para a gente atingir esta meta.

Por e-mail, a assessoria de imprensa da Porto informou após a entrevista que a empresa possui mais de 7 mil mulheres entre seus funcionários – elas representam 57% da força de trabalho, com 44% delas ocupando cargos de liderança. Além disso, a empresa tem cerca de 4,7 mil funcionários negros, com 281 (22%) em posições de liderança.

Além dos programas, há um trabalho bem importante de olhar a companhia, as diferentes áreas, a composição com todos esses diferentes recortes de diversidade. Onde a gente tem mais mulheres, mais homens, diferentes orientações sexuais, raça, etnia, pessoas com deficiência, além do recorte geracional Olhamos muito para onde temos gaps e como trabalhamos para ter pessoas com prontidão para assumir novos desafios. Por que? 

Um, é preciso ter a diversidade. Dois, é preciso ter a inclusão, um ambiente cada vez mais inclusivo, no qual todos participem, tenham voz e se sintam bem sendo quem são. 

Outro ponto é a representatividade. Como é que eu soube que eu poderia ter oportunidade ao longo da minha carreira? Eu tive líderes. Há 30 anos, trabalhei em multinacionais onde tive líderes mulheres, pretos, com deficiência e com diferentes orientações sexuais. E isso me ensinou pelo exemplo. 

É mais fácil entender por que diversidade e inclusão importam do ponto de vista individual do trabalhador. Mas por que essas pautas importam do ponto de vista de uma empresa?

Há empresas que fazem por convicção, outras por conveniência e outras por constrangimento. Vão ter empresas que falam assim: “Nossa, porque isso é importante para a gente ter diferentes ângulos, a gente toma decisões mais robustas, a gente tem uma representatividade aqui dentro dos nossos clientes.” Esse é um lado de negócio. 

Muitas empresas trabalham com esse olhar de negócio, que é legal, também. Agora, o nosso olhar é que nós operamos com diversidade e inclusão. Isso está nos nossos princípios, nos nossos valores. É como nós vamos operar. Ah, isso é bom para o negócio ou não? Nós acreditamos  que sim, como muitas empresas. Estamos no lugar dos valores e princípios, da essência da companhia.

Como executiva de RH, é preciso entender para onde o negócio vai, o que a cultura privilegia e não abre mão.

Estamos em um momento de muita transformação no mercado de trabalho, com o surgimento da inteligência artificial e mudanças trabalhistas. Ao mesmo tempo, muitos empresários têm reclamado da dificuldade para recrutar e manter pessoas no ambiente de trabalho. Como um gestor de RH pode encarar esses desafios?

Às vezes, ficamos muito em cima do que está rolando agora – IA, questões trabalhistas, NR-1. Tenho uma forma própria de encarar os desafios em geral. O primeiro passo é entender quais são os temas que estão rodando. É preciso estar informado, não só do tema, mas também como ele está dentro da organização. É importante ter referência do que o mercado está fazendo, mas ,de repente, o que o mercado está fazendo não vai funcionar na sua empresa em função do negócio, em função da cultura. E vice-versa.

O segundo ponto é entender muito bem qual é a estratégia do negócio. Como executiva de RH, é preciso entender para onde o negócio vai, o que a cultura privilegia e não abre mão. Você tem que entender onde você está, principalmente com indicadores. E tem que ter escuta da organização. E é preciso construir ações e iniciativas com a liderança e com os colaboradores.

Outro ponto é checar se a coisa está indo bem através de escuta, através de fóruns, pesquisas, para ir ajustando o caminho. Ou seja: você tem que ter toda essa forma de operar para entregar valor para a organização e para as pessoas que estão nessa organização. 

Também é necessário identificar onde as pessoas estão e onde elas têm que estar, em termos de capacidade – seja pela tecnologia, pelo negócio, pela competência. Também é importante ferramentalizar as pessoas. E para isso, o nome do jogo é educação. Educação não é só sobre sala de aula, não. É a orientação de como a gente faz o trabalho. No fundo, o segredo está muito no dia a dia, aprendendo e fazendo diferente. É preciso  checar a todo momento se a coisa está indo legal, para ir ajustando. Está tudo mudando o tempo todo, não tem nada que vá ficar de pé. É importante ir  checando, ouvindo, ajustando, sempre com as pessoas. Quem faz são as pessoas, não é o RH.

Gabriela Sá Pessoa é kornalista e pesquisadora. Atua como freelancer em São Paulo para a Associated Press, revista piauí, Rest of World e outros veículos. Já publicou no The New York Times, The Washington Post, The Boston Globe, BBC, UOL e Folha de S.Paulo. Possui experiência com pesquisa e checagem para audiovisual.

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