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A Importância dos grupos de afinidade para a diversidade
Espaços de troca de experiências, apoio e discussão são ponto importante nas organizações, mas não devem se tornar responsáveis pela mudança, defende quem trabalha com o tema em empresas como Raízen, Dia Brasil e BASF
Quem trabalha com diversidade ou se interessa pelo tema dentro das organizações provavelmente já ouviu falar nos grupos de afinidade. Normalmente formados por pessoas voluntárias e que têm o mesmo marcador de diversidade, como mulheres, PcDs, pessoas de origem preta e/ou indígena, LGBTQIA+, esses grupos têm servido cada vez mais como espaços de troca, apoio e acolhimento dentro de empresas e feito parte das estratégias de diversidade, equidade e inclusão (DE&I) das corporações.
Com cerca de 6 mil colaboradores espalhados entre os Estados de São Paulo e Minas Gerais, a companhia de varejo Dia Brasil é um dos exemplos de empresas que desenvolveram recentemente seu grupo de afinidade. Criado há pouco mais de um ano, em março de 2022, o coletivo Plurais reúne pessoas de diferentes características para discutir o assunto de uma forma ampla na empresa. “DE&I era um tema novo dentro da organização e quisemos entender como as pessoas poderiam se complementar”, conta Vivian Machado, head de cultura e engajamento da rede de supermercados.
Fundado em um momento de transição após a pandemia da covid-19, o Plurais teve como primeira finalidade entender as angústias das pessoas com relação à discriminação, ampliando esse debate dentro da empresa. “A intenção é tornar o tema disseminado e vivenciado na empresa. Quando as pessoas se permitem compartilhar, as histórias são muito importantes”, afirma a executiva, que define o trabalho com o grupo como uma “construção diária”.
A partir dos debates, o grupo e a empresa perceberam que era possível fazer mais – e o primeiro passo foi criar um censo de diversidade do Dia Brasil, respondido por 54% dos colaboradores. “A partir dali, percebemos o retrato da empresa. Se fôssemos personificar a companhia, a área corporativa seria uma mulher preta ou parda, cisgênero e heterossexual, da geração Y. Já no centro de distribuição, essa pessoa seria um homem preto cis e hétero, também pertencente à geração Y”, conta Vivian. O diagnóstico ajudou a área de DE&I da empresa a organizar treinamentos e campanhas internamente, com a supervisão do Plurais – entre os exemplos, há projetos de conscientização sobre nome social e aulas sobre antirracismo, muitas vezes assistidas pelos colaboradores das lojas pelo celular.
A intenção é tornar o tema disseminado e vivenciado na empresa. Quando as pessoas se permitem compartilhar, as histórias são muito importantes”
Companhia
O Dia Brasil não está só: nos últimos tempos, tem crescido o número de empresas que afirmam ter grupos de afinidade entre suas iniciativas de diversidade. Em pesquisa recente realizada pela startup BlendEdu com 117 empresas, os grupos de afinidade foram a terceira ação mais realizada pelas organizações. “A importância desses grupos é potencializar a voz dos grupos minorizados que estão nas organizações”, destaca Thalita Gelenske, CEO da startup, que ajuda empresas a colocarem o tema na pauta do dia a dia, por meio de produtos digitais, consultorias e treinamentos.
Segundo Thalita, começar um grupo de afinidade com enfoque interseccional, como acontece na rede varejista, é bastante comum em empresas que estão estruturando seus esforços de diversidade. Porém, segundo a especialista, o ideal é que cada pauta seja tratada por um grupo específico, que por sua vez, deve estar sempre em contato com os outros grupos, trocando experiências.
É algo que está no horizonte de Vivian Machado. “Como o Plurais é novo, buscamos olhar para questões que contemplem todas as pessoas, com a contribuição de todos. Hoje, trabalhar com todo mundo junto traz mais ganhos que perdas, mas não significa que, mais para a frente, a gente não possa segmentar”, afirma a executiva do Dia Brasil, que diz ter na comunicação com os colaboradores um desafio, uma vez que eles estão espalhados pelas lojas da varejista em inúmeros bairros e cidades.
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Estruturas
A dispersão geográfica é uma questão que também é enfrentada por outras empresas na hora de organizar seus esforços de equidade e inclusão. Na Raízen, por exemplo, a atividade dos grupos de afinidade (LGBTQIA+, étnico-racial, gênero e pessoas com deficiência) se soma a outra entidade: os comitês de diversidade das unidades. Nesses grupos, reúnem-se pessoas de diferentes marcadores, mas que trabalham em uma mesma sede da empresa, espalhada por várias regiões do Brasil.
Na Raízen, que atua nos mercados de energia, combustíveis, lubrificantes e produção de açúcar, as primeiras discussões sobre diversidade surgiram em 2017, a partir do debate sobre o espaço da mulher como liderança no mercado de trabalho e, mais especificamente, dentro do agronegócio. Aos poucos, as pautas foram se tornando mais sofisticadas. Hoje, alguns grupos de afinidade dentro da empresa somam dezenas de pessoas (a área étnico-racial tem cerca de 75 pessoas; o grupo LGBTQIA+, mais de 80), com encontros quinzenais pela internet, via Teams.
A participação nos grupos é voluntária, mas quem decide se envolver em projetos especiais também pode dedicar parte do seu tempo de trabalho a eles, conta Juliana Victal, especialista em diversidade e inclusão da empresa. “Quem se envolve com projetos estratégicos dos grupos de afinidade não precisa pedir autorização para o gestor, mas tem de prestar contas, com base em transparência e diálogo”, diz a executiva, que afirma que sensibilizar as lideranças é um aspecto fundamental do trabalho da área.
Segundo ela, esse trabalho é uma via de mão dupla: as lideranças dão o aval para que os colaboradores participem dos grupos de afinidade, ao mesmo tempo que sentem seu cotidiano sendo impactado pela atuação dos grupos. Entre os exemplos citados por Juliana, está a participação do grupo de transformadores (nome dado pela Raízen aos coletivos) em um projeto da área de finanças, em que o time sentiu que um projeto interno não andava para frente por falta de diversidade.
“Os grupos de afinidade não só compartilham suas dores, mas também estão trabalhando para o futuro da empresa”, afirma Juliana. Segundo ela, as discussões e leituras feitas pelos grupos, em conjunto, também ajudam a trazer insumos para que a área de diversidade crie campanhas e materiais para toda a empresa, como trilhas de aprendizagem. Além disso, os comitês das unidades também têm autonomia para criar projetos específicos – um exemplo citado por Juliana foi a criação de uniformes para mulheres que as deixassem mais confortáveis em suas funções.
Para Thalita Gelenske, da BlendEdu, é importante que os grupos não estejam sozinhos nos esforços de DE&I da empresa. “Sem estrutura ou orçamento dedicado, as organizações podem cometer uma injustiça: delegar para quem é afetado pelo problema a responsabilidade de resolver essa questão estrutural”, diz a CEO da startup. Concorda com ela Dayane Silva, business partner sênior do RH da Basf – e uma das lideranças do BIG (Black Inclusion Group), o grupo de diversidade étnico-racial da indústria.
“É importante que as empresas delimitem o papel do grupo de afinidade, que não deve trabalhar construindo métricas ou contratando pessoas”, diz Dayane. Na visão dela, a ideia de que o grupo é responsável por transformações pode ser prejudicial. “Se o grupo entender que ele vai fazer mudanças estratégicas, o engajamento não será mantido, porque as pessoas vão se frustrar.”
Novas habilidades
Criado em 2017, o BIG já existia quando Dayane se juntou à Basf, atuando na área de gestão de projetos. Na época, ela estava saindo de um período de licença maternidade e entendeu que precisava discutir mais a questão racial, não apenas por si mesma, mas também por ser mãe de uma menina negra. O envolvimento com o BIG, porém, fez com que a profissional descobrisse novos talentos e acabasse fazendo uma transição da carreira, trocando a área de projetos pelo RH.
“Ao liderar projetos e dar ideias, fazendo networking, eu desenvolvi habilidades que eu não teria vivenciado num fluxo normal de trabalho. Minha atividade era mais técnica, não precisava de comunicação e negociação, mas o BIG me apoiou nisso e acabou me levando para o RH”, diz Dayane. “Geralmente, as pessoas não pensam o quanto um grupo de afinidade pode agregar em termos de soft skills a uma pessoa.”
Além do BIG, a Basf tem outros três grupos de afinidade: o WIB (Women in Basf, voltado a mulheres), o Be Different (para pessoas com deficiência) e o BYOU (voltado à população LGBTQIA+). Cada um deles funciona de maneira autônoma, e segundo Dayane, um dos principais trabalhos da área de diversidade da empresa é guiar o trabalho desses grupos, mantendo a interseccionalidade e evitando que um tema se destaque frente aos outros.
Além disso, ela destaca a importância de patrocinadores internos dentro da empresa, com executivos da alta liderança sempre convidando os grupos de afinidade para conversas sobre negócios. “A gente usa essa estrutura de líder falando com líder para criar um rapport, um contato próximo, criando um empoderamento que tem muito valor”, afirma Dayane.
Na visão de Thalita, além de coordenar a atividade dos grupos e reunir insumos, a área de D&EI das empresas precisa ficar sempre atenta à saúde mental de quem atua nos grupos. “É muito diferente discutir diversidade ou um projeto. Se alguém diz que um projeto é besteira, faz parte; mas se alguém diz que isso é besteira, isso não é um julgamento sobre trabalho, mas sobre quem as pessoas são”, afirma a fundadora da BlendEdu.
A CEO da startup também faz o alerta para que as empresas que ainda não têm esforços em diversidade, equidade e inclusão não criem um grupo de afinidade como primeira ação, a fim de não sobrecarregar as pessoas. Já para o caso de companhias em que esses grupos se formaram organicamente, a dica é coletar dados, informações e indicadores sobre a empresa e o mercado, a fim de conscientizar a liderança e estruturar esforços efetivos.
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