Com base na análise de 370 perfis de líderes de RH das maiores empresas do País, pesquisa ressalta presença feminina no setor; Administração e Psicologia seguem como as principais áreas de formação, mas Engenharia vem logo atrás
Presente há mais de um século no Brasil, a Bayer tem por aqui seu segundo maior mercado no mundo. São três divisões – agro, farma e saúde – espalhadas por 26 unidades no País, com 4,6 mil funcionários. São números que mostram o tamanho da complexidade da operação nacional da companhia. Em meio a tanta atividade, um dos maiores desafios da organização é se comunicar de forma clara e eficiente com seus colaboradores, ainda mais em uma época em que o excesso de informação é um problema real.
Foi desse diagnóstico que surgiu o Em Foco, novo modelo de comunicação interna da Bayer Brasil: um boletim unificado, segmentado e enxuto para apoiar os colaboradores em suas tomadas de decisão. O projeto nasceu de um diagnóstico que é cada vez mais comum em grandes empresas: o excesso de mensagens, canais e boletins estava transformando a comunicação em um fator de dispersão – e não de engajamento.
“Há pesquisas globais mostrando que os colaboradores são interrompidos no trabalho a cada três minutos”, conta Thiago Massari, líder de Comunicação Integrada da Bayer Brasil.
Entendemos que o volume de informações estava impactando a saúde mental das pessoas. Era preciso simplificar e colocar o foco novamente no colaborador.
Para dar conta do desafio, a empresa criou um squad multidisciplinar, reunindo times de comunicação, RH, negócios e lideranças regionais, com a missão de reformular a maneira como as mensagens circulam internamente. O resultado foi um boletim semanal com três níveis de segmentação – nacional, de negócios e de localidades – que reduziu pela metade o número de envios e cortou em mais de 60% o volume de pautas mensais.
“Tudo comunica, mas nem tudo precisa ser dito”, resume o executivo. A frase sintetiza o espírito da nova estratégia, que aposta em curadoria, foco e priorização para fortalecer a cultura organizacional e o bem-estar dos colaboradores.
A seguir, o executivo explica como a Bayer redesenhou sua comunicação interna, por que o RH é um parceiro essencial nessa jornada de transformação e como a comunicação é um pilar importante em uma estratégia de maior autonomia das pessoas. “Antes, o colaborador era mais operacional. Agora, ele precisa tomar decisões. Mas para isso dar certo, é preciso mudar a comunicação”, ressalta Massari.
O principal motivador veio de um ponto de dor que não é só da Bayer, mas de todos: o excesso de informação. Começamos a entender a quantidade de conteúdo circulando para as pessoas em diversos âmbitos das vidas delas. Partimos de um modelo em que saúde importa em todas as esferas do que fazemos – e sabemos dos impactos que o excesso de informação e comunicação têm causado na saúde mental das pessoas. Hoje, há pesquisas globais que mostram que os colaboradores são interrompidos no seu trabalho a cada três minutos.
Desde a pandemia, estamos tentando mudar nossa estratégia de comunicação com os colaboradores, definindo hierarquia e centralização das informações. Somos uma empresa de 5 mil colaboradores, divididos em três grandes negócios, então há muito o que ser dito – e é preciso reduzir o volume para sermos assertivos. Além disso, vimos que o engajamento dos colaboradores começou a declinar quando iniciamos a volta ao presencial – hoje, temos um modelo híbrido de trabalho, sem número mínimo de dias no escritório. Para completar, tínhamos canais de comunicação fragmentados segundo os negócios e as localidades, temos mais de 20 localidades em todo o Brasil. Isso fazia com que, às vezes, um tema prioritário estivesse presente em mais de 10 boletins no mesmo mês. Diante disso, criamos um squad multidisciplinar, reunindo comunicação, RH, negócios e lideranças das localidades para repensar nossa estratégia de comunicação interna. Foi daí que surgiu o Em Foco.
Uma das coisas que falamos internamente é que tudo comunica, mas nem tudo precisa ser dito. Dentro de uma empresa com universo de temas, é fácil cair na problemática de que tudo importa. Além disso, o digital retirou o limite físico da curadoria, como acontecia num boletim de papel. Assim, precisamos criar uma régua de priorização, com um modelo forte de segmentação. O Em Foco é um boletim, em formato de newsletter, que é entregue para a toda a companhia uma vez por semana. Nela, há três níveis de segmentação: há dois temas de Brasil, que são iguais para todos os colaboradores. Antes, havia um boletim só para Brasil com nove temas. Aqui, o critério é pensar no que impacta o negócio no Brasil e no mundo, bem como pautas de cultura, benefícios essenciais, políticas e compliance.
O segundo nível de segmentação é o do negócio, com três pautas. Quem é de agro vai receber agro, quem é de farma vai receber farma, e assim por diante. Nesse caso, os temas envolvem objetivos estratégicos do negócio, impactos para o cliente e lançamentos. Por fim, o terceiro nível é o da localidade. Quem está em São Paulo, que é um escritório administrativo, recebe dois temas. Nas outras localidades, como Petrolina, Camaçari ou Belford Roxo, são quatro temas.
Essa diferença acontece porque as outras localidades são fábricas, de forma que a interação com a informação também é diferente. Nem todo mundo trabalha na frente do computador, o trabalho é todo presencial, então a relação que se estabelece ali é outra. Na seleção dos temas, entram os objetivos específicos da localidade – como um scorecard de produção, um aviso de paralisação de caldeira ou tudo que está relacionado à cultura e à comunidade local. Tudo que fica fora disso vai para os outros canais, mas não entra no boletim.
Sim. Passamos a ter uma diminuição de boletins e de volume de conteúdo. Nós tínhamos dez boletins por mês e agora são quatro. Eram mais de 90 pautas prioritárias por mês, agora são 28, no caso de São Paulo, ou 36, no caso das outras localidades. Além disso, cada boletim tinha três calls to actions. Agora, só temos um. Isso torna a vida mais fácil para o colaborador. Nós invertemos a polaridade. Antes, era mais complexo para o colaborador.
Agora, a complexidade está nos bastidores da produção. Há uma questão aqui, claro: o colaborador que trabalha em agro não recebe nenhuma novidade dos outros setores. Mas ele não está desassistido, porque nós temos outros canais de comunicação. A diferença é que são canais de não-interrupção, como TVs corporativas, a intranet ou uma rede social interna da empresa. Ali, o colaborador pode acessar as novidades de toda a empresa, mas em que ele define o momento que deseja acessar as informações, por quanto tempo. O que mudou é que ele é muito menos interrompido.
Colocamos o Em Foco no ar em 28 de agosto, e de lá para cá já vimos um aumento de 28% na taxa de engajamento dos colaboradores com os canais de comunicação.
A resposta da pergunta está justamente nessa ideia de centralidade no colaborador, de pensar no que é melhor e mais saudável para ele. Para trazer um bastidor, quando nós levamos a ideia do Em Foco para o board da Bayer no Brasil, a estratégia foi aprovada de forma unânime. Foi algo muito surpreendente, mas que revela o quão latente era essa necessidade de redução de comunicação. A resposta da pergunta também vem do nome do boletim: Em Foco. O foco é o que move a Bayer. E para isso, temos perguntado nas áreas: o que é foco para o RH? O que é foco para a transformação digital? Cada área está entendendo essa lógica e até se reorganizando. Há áreas, por exemplo, que estão definindo pessoas para serem pontos focais de comunicação.
As iniciativas do RH, por exemplo, são compartilhadas com essas pessoas, ajudando a criar um calendário e um planejamento de forma que não exista canibalização dos temas na jornada. Colocamos o Em Foco no ar em 28 de agosto, e de lá para cá já vimos um aumento de 28% na taxa de engajamento dos colaboradores com os canais de comunicação. E olha que nós mudamos a regra do jogo no meio do ano.
Para 2026, estamos rodando workshops em que a área de comunicação ajuda as áreas a pensar prioridades estratégicas, pensando os call-to-actions – que podem ser uma campanha de autodeclaração ou um lembrete da ferramenta de feedback, por exemplo. Pode parecer pouco só ter um call-to-action por boletim, mas são 52 call-to-actions por ano. Antes, eram três por boletim, mas o colaborador não fazia todos. Ficava-se com a falsa sensação de que a ação era pedida, mas não era completada. O que temos agora é isso: o engajamento é maior, porque estão se pedindo menos coisas.
O ponto de conexão é o olhar do RH para as pessoas – e no nosso caso, isso tem passado por uma transformação forte do nosso sistema de operação como empresa.
Sem dúvida. O RH é o nosso principal parceiro interno de comunicação, além de ter temas com altíssimo engajamento. Nesse movimento que fizemos, a parceria com o RH foi fundamental. Se o RH falasse que não ia dar certo, não íamos conseguir fazer esse movimento. Eles foram muito ativos na criação da estratégia. E acredito que, em outras empresas, os RHs têm de olhar para isso. Temos recebido muitos pedidos de benchmark de outras empresas, com as mais variadas estruturas. Tem gente de comunicação dentro do RH, tem RH que faz comunicação, tem empresa que nem área de comunicação tem, os modelos são muito distintos. O ponto de conexão é o olhar do RH para as pessoas – e no nosso caso, isso tem passado por uma transformação forte do nosso sistema de operação como empresa.
Desde 2023, temos um novo CEO global na Bayer, que é o Bill Anderson. É o primeiro CEO americano para uma empresa que historicamente teve CEOs alemães. E ele traz à tona um sistema de operação baseado em menos hierarquia e mais horizontalidade, permitindo que a tomada de decisão também não esteja só com o líder, mas também com o colaborador na ponta. Para isso dar certo, é preciso mudar a comunicação, porque antes o colaborador era mais operacional e agora ele precisa tomar decisões. É algo que tem acontecido em muitas empresas – e acredito que se o RH não estiver à frente dessa transformação, ele precisa ser um grande influenciador ou parceiro dentro dessa jornada de mudança de modelo de comunicação corporativa.
Exatamente. É um cuidado aqui com autonomia para que o colaborador possa também tomar as decisões. E isso é complexo: hoje, temos algumas pessoas dentro da organização que não estão conectadas a um único negócio. É o meu caso, por exemplo. E nós demos para as pessoas a opção de escolher o conteúdo que queriam receber no boletim delas. Mas demos a recomendação de não optar por receber tudo. Ainda assim, em vez de tomar a decisão pelo colaborador, a gente dá autonomia para que ele sinalize o que quer consumir de informação.
Hoje, a IA tem sido um ponto estratégico do time de comunicação. Antes, o time de comunicação era responsável por Brasil e São Paulo. Com o Em Foco, ele cuida também dos três negócios e orienta o time das localidades. E eu não contratei nenhuma pessoa a mais para o time. Como ganhamos escala? Com a IA. Ela nos ajuda a modular o desdobramento do conteúdo dos negócios – ao mesmo tempo em que as pessoas que atuavam em comunicação nos negócios estão lá também, investindo o tempo delas em outras frentes de comunicação estratégica para o negócio. A IA nos dá uma capacidade muito grande. No primeiro trimestre do ano que vem, ela estará no centro de outra estratégia: a customização da intranet para cada colaborador.
Espero que consigamos contar uma história de como simplificamos ainda mais a nossa comunicação de forma eficiente, transformando áreas parceiras. Queremos influenciar a mentalidade de comunicação. Queremos que os líderes, ao se comunicar com seu time, tenham a mentalidade de foco. Que um colaborador, ao se comunicar com um par, com um grupo ou ao criar conteúdo, também tenha essa mentalidade de foco.
Não sei se é um conselho, mas é uma pergunta chave: se você tivesse de derrubar todas as ações da sua área, qual é a única ação que manteria de pé? É uma pergunta que ajuda a dar um olhar muito claro sobre foco e priorização. Mais do que nunca, o RH tem de trabalhar com um modelo de planejamento e de escala de conteúdo. O que eu digo sempre é que muita gente se comunica como criador de conteúdo, mas não como consumidor – e isso tem que ser o oposto. Muita gente pensa sempre em um novo vídeo, um podcast, um evento. A grande pergunta é: você se engajaria com o que você está criando? É importante pensar como consumidor – e não como criador.
Tenho um livro de cabeceira que não é de comunicação, mas que me ajuda muito: The Culture Map, da Erin Meyer. É um livro muito interessante, especialmente para empresas multinacionais, que trabalham com multiculturalismo. A Erin foi uma executiva que ajudava expatriados a atuarem em diferentes culturas. Nesse contexto, as nuances do que é prioridade são muito variáveis. E o livro fala justamente sobre como criar uma série de réguas culturais e comportamentais, colocando os países nessas réguas, criando paralelos e mostrando o quanto é desafiador trabalhar em empresas multiculturais.
É preciso rapidamente adaptar as estratégias e mudar a forma de pensar os comportamentos, as ações, com base nessas ações adaptativas. O que eu sempre trago como reflexão é que nós precisamos nos adaptar o tempo todo. E uma das grandes lições da comunicação é o fato de ser necessário entender que nosso papel é muito maior do que levar ou trazer informações, mas que as informações moldam a cultura e os comportamentos.
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