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Sua empresa faria feio na COP30?

Não basta parecer sustentável. É preciso criar ambientes que respeitem tempo, corpo e cidade — valores que a nova geração já considera inegociáveis

Raul Juste Lores
19 de novembro de 2025
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Uma famosa headhunter me contou que uma executiva tinha topado permanecer em uma empresa, mesmo com ofertas de salários maiores, porque “aqui, eu consigo sair do escritório e ainda ver o por do sol”, suspirou, radiante. E, acredite, ela não é uma hippie em 2025.

Neste ano de COP30, Belém e debates sobre a sinceridade dos compromissos ambientais, o desafio de ser, e não apenas parecer, sustentável, é enorme, já que equipes cada vez mais jovens fazem essa pergunta do sol e da natureza no emprego o tempo todo.

Já vou falar de arquitetura e se algum sol pode ser admirado da sede de sua empresa, sem um vidro espelhado que impeça ver a cor da luz ou abrir a janela. Mas comecemos falando de localização: há 91 estações de metrô e 57 estações de trem da CPTM em São Paulo. Muito pouco, sob qualquer critério, mas são quase 150 pontos de transporte de massa que funciona da manhã à noite. 

Questão: o colaborador consegue chegar a pé, sem estar esbaforido ou suado, à sua empresa a partir de alguma dessas estações? Ou a sede da empresa fica perto da casa do CEO ou do dono, que jamais precisou depender de transporte público?

Se o estacionamento da sua empresa tem 100, mil ou dez mil vagas de estacionamento, que vivem cheias porque carro é necessário até para ir almoçar, vai ser muito difícil convencer seu colaborador da geração Z que a empresa é sincera. E que leva em conta valores muito importantes pra ele.

Não importa se o prédio da sua empresa tem uma certificação ISO 100 000 ou ISO um milhão. Esses carimbos de eficiência energética ou sustentável têm credibilidade modesta com jovens que foram educados a desconfiar de marketing. O elevador inteligente não compensa a sede em um campus no meio do nada ou o ar condicionado 24 horas, que prejudica especialmente as colaboradoras que não querem um tailleur sufocante. 

Há duchas para quem é adepto da mobilidade ativa, e quer chegar no trabalho pedalando? Há uma cozinha bacana para quem gosta de cozinhar em casa e apenas esquentar a sua futura quentinha no horário do almoço? Seria ótimo ter compostagem por ali também para os muitos restos que produzimos.

Um RH esperto sabe que milhões de caixas de delivery em qualquer recepção não pegam bem. São milhões de caixas e pacotes por ano. Na Europa  —  onde a sociedade costuma ser bem mais consciente em relação ao ambiente e ao consumismo que nos EUA  — até a Amazon já está testando pacotes recicláveis. 

Os bebedouros são confiáveis? Desestimulam o uso das garrafinhas plásticas descartáveis? A reciclagem é pra valer? Os sensores desligam de fato as luzes e a energia em salas ou andares que estão sem ocupantes?

E, por fim, chegamos à arquitetura, minha paixão assumida por aqui. Por obrigação profissional, visito dezenas de empresas em São Paulo, no Rio, em Belo Horizonte e no Recife todo ano. Graças a uma parceria com o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil, o CAU-BR, tenho visitado capitais em todo o país para produzir vídeos no meu canal no YouTube, o São Paulo nas Alturas. Quanto maior a empresa que visito, maior a decepção. Muitas das nossas sedes parecem resultado de inteligência artificial e com as perguntas mais preguiçosas para a IA.

Vejo os mesmos escritórios de “arquitetura corporativa” repetindo o Google de 20 anos atrás, e achando que uma mesa de sinuca, uns pufes coloridos e umas frases motivacionais adolescentes são suficientes para uma cultura “moderninha”. Se você convida os mesmos arquitetos que fizeram outras cem sedes de empresas, é porque a palavra “inovação” está tão gasta quanto “sustentabilidade” na sua agenda.

Se a torre espelhada da sua empresa tem solitárias palmeiras, é porque ninguém pensou no paisagismo. Na sombra, na seca, na chuva forte ou na necessidade de absorção pluvial. O gramado artificial, acredite, causa urticária até no colaborador que acredita que ambientalismo é coisa de ecochato. Não é.

São empresas médias e pequenas onde tenho visto arquitetura mais criativa e uma curadoria de arquitetura e localização menos piloto automático. Sedes não só decoradas, mas construídas com materiais locais ou reciclados. Com bambu, madeira e materiais isolantes para temperatura mais natural. Com economia circular  — da empresa e entre os funcionários  —, mas também com mobiliário multifuncional e facilmente deslocável. Com lugares de armazenamento e armários para os funcionários que têm regimes híbridos carregarem menos coisas no dia a dia. 

Essas empresas em prédios corporativos menos convencionais, não raro oferecem o máximo de luz natural, sem barreiras, e até a entrada de ar, com ventilação pensada, e não só artificial (bons arquitetos resolvem isso na prancheta!). Muito aquecimento, muito ar-condicionado, muita luz de escritório (ou de padaria) mandam sinais turvos do compromisso ambiental de uma empresa. Nenhuma ativação ou patrocínio de atividades marqueteiras em Belém conserta isso. Seu funcionário está de olho. E mais gente vai decidir trocar de trabalho só pra ver o pôr do sol.

*As colunas são textos de opinião e não refletem, necessariamente, o posicionamento de Cajuína.

Raul Juste Lores é jornalista e escritor. É autor do livro “São Paulo nas Alturas”, colunista do UOL e criador do canal São Paulo nas Alturas, que já superou a marca de 20 milhões de visualizações no Youtube.