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O Livro ‘O Efeito Microestresse’ de Rob Cross e Karen Dillon explora tensões (quase) invisíveis
Em entrevista à Cajuína, os autores explicam os conceitos centrais de seu livro e como o microestresse pode ser combatido para uma vida mais equilibrada e produtiva
Karina Sérgio Gomes
10 de abril de 2025
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O estresse raramente chega como um trovão. Ele se infiltra, gota a gota, até que, um dia, percebemos o peso acumulado sem sequer sabermos de onde veio. Foi exatamente essa constatação que surpreendeu o pesquisador e escritorRob Cross durante uma conversa com uma executiva de alto nível.
“A primeira vez que essas ideias realmente me impactaram foi quando parei no meio de uma entrevista e perguntei: como você acabou se metendo em problemas?”, diz Rob, em entrevista a Cajuína. A resposta não veio com o relato de um evento isolado, uma crise ou um grande erro. O que surgiu foi um padrão: um acúmulo silencioso de pequenas tensões que, somadas, desgastam até os mais resilientes.
Essa percepção levou à investigação de Rob e Karen Dillon sobre os microestresse – essas pressões sutis do dia a dia que minam energia, criatividade e bem-estar sem que nos demos conta. Rob Cross, professor de liderança global na Babson College e cofundador do Connected Commons, e Karen Dillon, especialista em liderança e desenvolvimento organizacional, publicaram suas descobertas no livro O Efeito Microestresse, lançado pela editora Objetiva.
Karen destaca que esse impacto não se distribui de maneira igual: “Na verdade, nossos dados mostram que as mulheres são muito mais afetadas pelo microestresse do que os homens.” No ambiente profissional, ela observa que equipes sobrecarregadas deixam de agir estrategicamente e passam a apenas reagir. “Se eles estão sendo reativos em vez de proativos, isso pode indicar um problema cultural de microestresse”, alerta.
Com soluções práticas e um olhar atento para os detalhes da rotina, Rob e Karen mostram que aliviar esse peso invisível pode ser o primeiro passo para uma vida mais equilibrada e produtiva. A seguir, leia os principais trechos da entrevista dos autores para a Cajuína.
No início, Rob disse que não planejava escrever este livro. Mas, ao conversar com as pessoas, percebeu como os pequenos estresses diários se acumulam e afetam a vida delas. Rob, quando foi que você percebeu pela primeira vez que o microestresse era o verdadeiro problema e que precisava ser discutido?
Rob: Tudo começou com minha primeira entrevista, com uma mulher fantástica no Reino Unido, uma executiva que transformou sua vida. Ela deixou de ser sedentária para correr maratonas com seu parceiro e passou a cuidar de si mesma. Grande parte dessa mudança veio dos grupos em que trabalhou, que a ajudaram a manter um estilo de vida saudável. A primeira vez que percebi o impacto dos pequenos momentos foi quando perguntei: como você acabou se metendo em problemas? O que levou alguém tão inteligente e bem-sucedida a precisar mudar? Era o acúmulo de pequenos estresses. A partir daí, seguimos investigando como esses momentos surgem nos relacionamentos, criando tensão sem que percebamos ou ajamos. E isso foi se aprofundando em todas as entrevistas. Não eram os grandes eventos que estrangulavam as pessoas, mas o lento acúmulo de pequenas pressões, levando-as a padrões e expectativas pouco saudáveis.
Ao ler o livro, fiquei pensando que esse é um problema tão comum para as mulheres – lidar com o estresse do trabalho, da família e cuidar dos outros. Karen, você notou esse aspecto de gênero durante sua pesquisa? Ou acha que as mulheres são apenas melhores em lidar com pequenos estressores?
Karen: Você está certa. Na verdade, nossos dados mostram que as mulheres são muito mais afetadas pelo microestresse do que os homens. Ambos os gêneros são afetados, mas as mulheres, talvez por causa da sobrecarga de papéis tanto no trabalho quanto em casa, definitivamente estão mais sujeitas ao microestresse. E eu realmente acho que elas são melhores em lidar com isso em muitas situações antes que se torne um problema. Mas, eventualmente, o microestresse se torna um problema para todos.
Quais são os primeiros sinais de microestresse aos quais os líderes devem prestar atenção?
Karen: Preste atenção quando sua equipe começar a “dar bolas foras” — especialmente se estiverem sendo reativos, em vez de proativos, sobre o que querem e deveriam fazer para ajudar a empresa a avançar. Isso pode indicar um problema cultural de microestresse. Se nenhum funcionário estiver desempenhando seu melhor trabalho, é hora de agir.
Assim como a fofoca, o microestresse pode se espalhar rapidamente entre os membros da equipe. Como podemos evitar que isso aconteça?
Karen: Reconhecer que isso é real e acontece — até a linguagem do microestresse — pode ser muito útil. Sabemos que o microestresse se espalha entre as pessoas. Pesquisas sugerem que, apenas ao estar na mesma sala com alguém estressado, nosso coração pode bater mais rápido e os níveis de estresse aumentam de várias formas. Portanto, reconhecer isso e tentar difundir entendimento do microestresse nas interações individuais pode ser um bom começo para reduzi-lo.
Acho que pode se tornar muito importante para os líderes definirem o tom sobre quais coisas são as prioridades, quais formas de comunicação, como vamos interagir juntos?
O livro aponta os problemas de comunicação como a grande causa de microestresse. Falar claramente e repetir informações ajuda ou pode aumentar a pressão? E como o trabalho remoto, que exige mais comunicação, afeta essa dinâmica?
Karen: Mensagens de texto, Slack, e-mails, espaços colaborativos, reuniões presenciais, chamadas no Zoom, etc. Tudo isso aumenta a possibilidade de microestresse, porque você nunca tem certeza de qual delas deve responder. Você acaba respondendo a todas. De repente, todo mundo está tentando acompanhar a comunicação em vez de usá-la como uma ferramenta eficaz. Acho que pode se tornar muito importante para os líderes definirem o tom sobre quais coisas são as prioridades, quais formas de comunicação, como vamos interagir juntos? E como você pode garantir que até mesmo alguém em um local remoto está recebendo a informação certa, as perguntas certas, em vez de ser inundado por uma avalanche de interações microestressadas que podem piorar ainda mais as coisas?
É possível ter uma rotina de trabalho e interagir com os colegas sem sofrer microestresse? Ou o objetivo deve ser apenas minimizá-lo e aprender a lidar melhor com ele?
Rob: Pessoalmente, não acho que seja possível hoje em dia. Vivenciamos microestresses devido à hiperconectividade trazida pela tecnologia, tanto no trabalho quanto na vida pessoal. Amigos e família, por quem nos preocupamos e cuidamos, podem ser microestressores. Eles são tão impactantes, se não mais, do que pessoas tóxicas no trabalho, que criam estresse negativo. Durante a pandemia, muitas empresas mudaram de reuniões de uma hora para 30 minutos, dobrando o número diário e acumulando trabalho. Isso exige mais foco e rapidez, aumentando a carga de estresse. Se considerarmos outras formas de hiperconexão, o potencial de estresse só cresce. A questão não é eliminá-lo, mas gerenciá-lo proativamente.
É realmente muito importante estabelecer alguns limites claros, porque, caso contrário, você verá que sua equipe estará trabalhando quase o tempo todo.
Um dos principais motivos do microestresse é o fato de que o trabalho muitas vezes se estende para o tempo pessoal. Você sugere estratégias como programar e-mails durante o horário de trabalho e priorizar atividades pessoais, mas isso ainda pode ser difícil para algumas pessoas. Por que é tão importante estabelecer limites claros no trabalho? E qual é a melhor maneira de implementá-los na prática?
Karen: É realmente muito importante estabelecer alguns limites claros, porque, caso contrário, você verá que sua equipe estará trabalhando quase o tempo todo. E a realidade é que nenhum de nós está no seu melhor quando nos sentimos assim. Os líderes podem ir muito longe no estabelecimento de limites, dando exemplo, deixando claro o que é aceitável para a equipe. Por exemplo, algo tão simples como os líderes reconhecerem que, se enviarem e-mails para a equipe tarde da noite, isso causará microestresse em outras pessoas. Algo simples como colocar uma nota no final dizendo: “Estou enviando isso agora porque é conveniente para mim, mas não espero que você responda até o horário de trabalho.” Algo assim pode ter um grande impacto.
Além disso, considerando a evolução dos tipos de trabalho, como o conceito de jornada de trabalho — originalmente estabelecido em fábricas e lojas, onde o local de trabalho ditava as horas de trabalho — pode ser entendido no contexto atual, onde o tempo de trabalho não é mais tão rígido? Como isso afeta a dinâmica do microestresse?
Karen: O ponto-chave sobre o microestresse é que ele surge nas interações entre as pessoas. E isso só piorou na última década devido à maneira como colaboramos entre equipes e organizações, e à forma como as organizações se tornaram menos hierárquicas. Entender a importância dos limites entre trabalho e vida pessoal é essencial para o bom desempenho. Acho que o fato de termos perdido nossos limites à medida que a tecnologia possibilitou que ficássemos conectados o tempo todo é apenas uma receita para mais microestresse e, novamente, é muito importante que os líderes e gerentes modelam e prestem atenção nisso, e que os indivíduos tentem recuperar alguns desses limites, para que o trabalho não se torne 24 horas por dia, 7 dias por semana de alguma forma.
O livro fala sobre a importância de ter uma vida multidimensional. Vocês argumentam que isso ajuda a reduzir o estresse. Por que ter projetos fora do trabalho faz tanta diferença?
Rob: O que podemos ver de forma geral é que ter ao menos dois ou três grupos autênticos, além da profissão e da família, é essencial para manter os microestresses em perspectiva. Pessoas com vidas unidimensionais sentem tudo como um peso insuportável, enquanto aquelas com dimensões mais amplas lidam melhor com o estresse. Esses grupos ajudam a valorizar diferentes aspectos da vida e a enxergar o que realmente importa. Quem não tem essa diversidade tende a se envolver excessivamente com os microestresses, sem conseguir manter a perspectiva.
O que observamos no trabalho é que as pessoas que tomaram decisões para melhorar sua saúde física – seja por meio de exercícios, nutrição, meditação ou sono – foram as que mais persistiram ao longo do tempo
O livro destaca a importância da atividade física para lidar com o estresse, mas muitas pessoas deixam de se exercitar por causa do trabalho. Por que é essencial reservar um tempo para a atividade física todos os dias e não deixar o trabalho atrapalhar?
Rob: A saúde física e o bem-estar são cruciais tanto para lidarmos com o estresse quanto para superá-lo, nos permitindo experimentar um senso de energia que, por sua vez, contagia os outros. O que observamos no trabalho é que as pessoas que tomaram decisões para melhorar sua saúde física – seja por meio de exercícios, nutrição, meditação ou sono – foram as que mais persistiram ao longo do tempo. Quando essas decisões foram inseridas em um contexto coletivo, onde as expectativas eram claras, como participar de um jogo de tênis, correr ou adotar hábitos alimentares mais saudáveis em família, essas pessoas foram as que realmente se mantiveram comprometidas com a atividade.
Jornalista formada pela Faculdade Cásper Líbero e mestre em Artes visuais pelo Instituto de Artes da UNESP, já escreveu para veículos como Folha de S.Paulo, NeoFeed, Metrópoles, O Estado de S. Paulo, revistas GOL e Veja São Paulo. Trabalhou na curadoria de exposições no MAM São Paulo e no CCSP.