Nos últimos anos o etarismo tem aparecido cada vez mais nos tribunais brasileiros e do exterior como pauta de processos trabalhistas; Entenda como isso afeta as empresas e por que deve estar no radar dos RHs

O estresse raramente chega como um trovão. Ele se infiltra, gota a gota, até que, um dia, percebemos o peso acumulado sem sequer sabermos de onde veio. Foi exatamente essa constatação que surpreendeu o pesquisador e escritor Rob Cross durante uma conversa com uma executiva de alto nível.
“A primeira vez que essas ideias realmente me impactaram foi quando parei no meio de uma entrevista e perguntei: como você acabou se metendo em problemas?”, diz Rob, em entrevista a Cajuína. A resposta não veio com o relato de um evento isolado, uma crise ou um grande erro. O que surgiu foi um padrão: um acúmulo silencioso de pequenas tensões que, somadas, desgastam até os mais resilientes.
Essa percepção levou à investigação de Rob e Karen Dillon sobre os microestresse – essas pressões sutis do dia a dia que minam energia, criatividade e bem-estar sem que nos demos conta. Rob Cross, professor de liderança global na Babson College e cofundador do Connected Commons, e Karen Dillon, especialista em liderança e desenvolvimento organizacional, publicaram suas descobertas no livro O Efeito Microestresse, lançado pela editora Objetiva.
Karen destaca que esse impacto não se distribui de maneira igual: “Na verdade, nossos dados mostram que as mulheres são muito mais afetadas pelo microestresse do que os homens.” No ambiente profissional, ela observa que equipes sobrecarregadas deixam de agir estrategicamente e passam a apenas reagir. “Se eles estão sendo reativos em vez de proativos, isso pode indicar um problema cultural de microestresse”, alerta.
Com soluções práticas e um olhar atento para os detalhes da rotina, Rob e Karen mostram que aliviar esse peso invisível pode ser o primeiro passo para uma vida mais equilibrada e produtiva. A seguir, leia os principais trechos da entrevista dos autores para a Cajuína.
Rob: Tudo começou com minha primeira entrevista, com uma mulher fantástica no Reino Unido, uma executiva que transformou sua vida. Ela deixou de ser sedentária para correr maratonas com seu parceiro e passou a cuidar de si mesma. Grande parte dessa mudança veio dos grupos em que trabalhou, que a ajudaram a manter um estilo de vida saudável. A primeira vez que percebi o impacto dos pequenos momentos foi quando perguntei: como você acabou se metendo em problemas? O que levou alguém tão inteligente e bem-sucedida a precisar mudar? Era o acúmulo de pequenos estresses. A partir daí, seguimos investigando como esses momentos surgem nos relacionamentos, criando tensão sem que percebamos ou ajamos. E isso foi se aprofundando em todas as entrevistas. Não eram os grandes eventos que estrangulavam as pessoas, mas o lento acúmulo de pequenas pressões, levando-as a padrões e expectativas pouco saudáveis.
Karen: Você está certa. Na verdade, nossos dados mostram que as mulheres são muito mais afetadas pelo microestresse do que os homens. Ambos os gêneros são afetados, mas as mulheres, talvez por causa da sobrecarga de papéis tanto no trabalho quanto em casa, definitivamente estão mais sujeitas ao microestresse. E eu realmente acho que elas são melhores em lidar com isso em muitas situações antes que se torne um problema. Mas, eventualmente, o microestresse se torna um problema para todos.
Karen: Preste atenção quando sua equipe começar a “dar bolas foras” — especialmente se estiverem sendo reativos, em vez de proativos, sobre o que querem e deveriam fazer para ajudar a empresa a avançar. Isso pode indicar um problema cultural de microestresse. Se nenhum funcionário estiver desempenhando seu melhor trabalho, é hora de agir.
Karen: Reconhecer que isso é real e acontece — até a linguagem do microestresse — pode ser muito útil. Sabemos que o microestresse se espalha entre as pessoas. Pesquisas sugerem que, apenas ao estar na mesma sala com alguém estressado, nosso coração pode bater mais rápido e os níveis de estresse aumentam de várias formas. Portanto, reconhecer isso e tentar difundir entendimento do microestresse nas interações individuais pode ser um bom começo para reduzi-lo.
Acho que pode se tornar muito importante para os líderes definirem o tom sobre quais coisas são as prioridades, quais formas de comunicação, como vamos interagir juntos?
Karen: Mensagens de texto, Slack, e-mails, espaços colaborativos, reuniões presenciais, chamadas no Zoom, etc. Tudo isso aumenta a possibilidade de microestresse, porque você nunca tem certeza de qual delas deve responder. Você acaba respondendo a todas. De repente, todo mundo está tentando acompanhar a comunicação em vez de usá-la como uma ferramenta eficaz. Acho que pode se tornar muito importante para os líderes definirem o tom sobre quais coisas são as prioridades, quais formas de comunicação, como vamos interagir juntos? E como você pode garantir que até mesmo alguém em um local remoto está recebendo a informação certa, as perguntas certas, em vez de ser inundado por uma avalanche de interações microestressadas que podem piorar ainda mais as coisas?
Rob: Pessoalmente, não acho que seja possível hoje em dia. Vivenciamos microestresses devido à hiperconectividade trazida pela tecnologia, tanto no trabalho quanto na vida pessoal. Amigos e família, por quem nos preocupamos e cuidamos, podem ser microestressores. Eles são tão impactantes, se não mais, do que pessoas tóxicas no trabalho, que criam estresse negativo. Durante a pandemia, muitas empresas mudaram de reuniões de uma hora para 30 minutos, dobrando o número diário e acumulando trabalho. Isso exige mais foco e rapidez, aumentando a carga de estresse. Se considerarmos outras formas de hiperconexão, o potencial de estresse só cresce. A questão não é eliminá-lo, mas gerenciá-lo proativamente.
É realmente muito importante estabelecer alguns limites claros, porque, caso contrário, você verá que sua equipe estará trabalhando quase o tempo todo.
Karen: É realmente muito importante estabelecer alguns limites claros, porque, caso contrário, você verá que sua equipe estará trabalhando quase o tempo todo. E a realidade é que nenhum de nós está no seu melhor quando nos sentimos assim. Os líderes podem ir muito longe no estabelecimento de limites, dando exemplo, deixando claro o que é aceitável para a equipe. Por exemplo, algo tão simples como os líderes reconhecerem que, se enviarem e-mails para a equipe tarde da noite, isso causará microestresse em outras pessoas. Algo simples como colocar uma nota no final dizendo: “Estou enviando isso agora porque é conveniente para mim, mas não espero que você responda até o horário de trabalho.” Algo assim pode ter um grande impacto.
Karen: O ponto-chave sobre o microestresse é que ele surge nas interações entre as pessoas. E isso só piorou na última década devido à maneira como colaboramos entre equipes e organizações, e à forma como as organizações se tornaram menos hierárquicas. Entender a importância dos limites entre trabalho e vida pessoal é essencial para o bom desempenho. Acho que o fato de termos perdido nossos limites à medida que a tecnologia possibilitou que ficássemos conectados o tempo todo é apenas uma receita para mais microestresse e, novamente, é muito importante que os líderes e gerentes modelam e prestem atenção nisso, e que os indivíduos tentem recuperar alguns desses limites, para que o trabalho não se torne 24 horas por dia, 7 dias por semana de alguma forma.
Rob: O que podemos ver de forma geral é que ter ao menos dois ou três grupos autênticos, além da profissão e da família, é essencial para manter os microestresses em perspectiva. Pessoas com vidas unidimensionais sentem tudo como um peso insuportável, enquanto aquelas com dimensões mais amplas lidam melhor com o estresse. Esses grupos ajudam a valorizar diferentes aspectos da vida e a enxergar o que realmente importa. Quem não tem essa diversidade tende a se envolver excessivamente com os microestresses, sem conseguir manter a perspectiva.
O que observamos no trabalho é que as pessoas que tomaram decisões para melhorar sua saúde física – seja por meio de exercícios, nutrição, meditação ou sono – foram as que mais persistiram ao longo do tempo
Rob: A saúde física e o bem-estar são cruciais tanto para lidarmos com o estresse quanto para superá-lo, nos permitindo experimentar um senso de energia que, por sua vez, contagia os outros. O que observamos no trabalho é que as pessoas que tomaram decisões para melhorar sua saúde física – seja por meio de exercícios, nutrição, meditação ou sono – foram as que mais persistiram ao longo do tempo. Quando essas decisões foram inseridas em um contexto coletivo, onde as expectativas eram claras, como participar de um jogo de tênis, correr ou adotar hábitos alimentares mais saudáveis em família, essas pessoas foram as que realmente se mantiveram comprometidas com a atividade.
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