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Afinal, o que significa ser líder de si mesmo?

Neste artigo, a professora da FDC Elisângela Furtado propõe uma discussão sobre liderança e dá dicas de competências e técnicas que podem ser desenvolvidas para liderar a si mesmo

Convidado Fundação Dom Cabral
19 de agosto de 2025
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*Por Elisângela Furtado

Durante o curso de especialização, ao ser questionado pela motivação em buscar tal formação, um colega de turma compartilhou que desde criança sonhava poder liderar outras pessoas. Essa memória me faz pensar que, dentre as mais diversas razões pelas quais o tema Liderança é um dos mais estudados em Ciências Sociais, figura o glamour que ela envolve.

A quantidade de pessoas consumindo e produzindo conhecimento sobre o tema forma uma teia de significados muito ampla, situação na qual incluo o termo ‘líder de si’. Uma consulta rápida à redes sociais, livrarias e até em bases acadêmicas já é suficiente para se perceber a relevância que o tema possui. Eduardo Ferraz produziu um livro sobre o assunto publicado em 2019, intitulado ‘Seja a pessoa certa no lugar certo: saiba como escolher empregos, carreiras e profissões mais compatíveis com sua personalidade’. A ideia ali é reforçar a importância do autoconhecimento como forma de aumentar o protagonismo sobre os caminhos trilhados na carreira profissional. No livro, a ideia de aumentar o controle sobre a própria vida para alcançar sucesso é absolutamente irresistível.

Passados alguns anos e ao ver as trends, me pergunto o quanto a compreensão sobre o que significa ser líder de si teria sofrido redução ao ponto de se tornar algo possível após adotar cinco passos básicos. A rapidez, profundidade e complexidade das mudanças que experimentamos nos últimos anos revelam que a crença de que seja possível prever e controlar o próprio futuro por meio da autoliderança não é só uma ideia impossível, como também ingênua. 

Ao mesmo tempo, a incerteza não pode ser um argumento para a resignação às circunstâncias, já que é justamente em tais condições que pessoas com propósito firme se sobressaem. Então o que deve compreender como líder de si e como essa compreensão pode nos ajudar a nos tornarmos líderes melhores? O primeiro ponto importante é entender o tamanho do desafio envolvido. Pense quantas vezes fez um compromisso consigo mesmo, mas priorizou outras agendas? Em quantas outras, abriu mão daquilo no qual acreditava? Ser líder de si mesmo não é algo fácil, mas pode ser desenvolvido com técnica e para isso é possível destacar algumas competências. 

  • O autoconhecimento é necessário por ser o ponto de partida em relações humanas. Quando não nos conhecemos bem, corremos o risco de abrir mão daquilo que acreditamos sempre que estivermos diante de um processo de negociação para evitar atritos e ser mais aceitos. Nas palavras de Ann Cunliffe (2016), esse tipo de comportamento é a interação reflexa, que é algo que fazemos sem ter que pensar em como fazemos. Em tais condições, reproduzimos aquilo que é confortável, habitual e inconsciente e que nem sempre nos aproxima daquilo que realmente queremos. Reconhecer as próprias potencialidades e as fragilidades é um recurso valioso para nos fortalecer e conseguirmos alcançar objetivos profissionais, porém autoconhecimento não basta. O foco excessivo em si mesmo pode resultar em um liderança apaixonada por sua própria imagem, tal como Narciso, figura mitológica que sucumbiu ao se encantar pelo seu próprio reflexo. 
  • A reflexividade, que significa a capacidade de fazer análise de si e das suas próprias ações, e como esse conjunto influencia suas relações também é importante. Uma pessoa reflexiva questiona suas próprias concepções, pensamentos e comportamento e é capaz de ajustá-los para alcançar seus objetivos. Essa competência também ajuda na ponderação de consequências. Outro ganho relativo é a confiança, uma vez que ela não está baseada na validação externa, mas na proatividade.  
  • A posicionalidade, que é a capacidade de reconhecer sua posição e das demais pessoas no contexto corporativo e social, também contribui. Por fim, destaco o engajamento, já que o líder de si se conhece, tem objetivos definidos e está disposto a fazer o esforço necessário para alcançá-los. Na prática, se manter engajado em algo a favor de um ganho maior no futuro envolve consciência e disciplina e isso nem sempre é um lugar confortável, mas sem dúvida é um território de coragem. 

Em tempos de incerteza, a necessidade de ser líder de si aumenta e pode ser a chave para mudança pessoal e profissional. A reflexividade é um caminho possível para fugir das ciladas que permeiam o caminho do desenvolvimento. 

Quer saber mais? Leia: 

Cunliffe, A. L. (2016). “On becoming a critically reflexive practitioner” redux: What does it mean to be reflexive?. Journal of management education, 40(6), 740-746. https://journals.sagepub.com/doi/abs/10.1177/1052562916668919

 *Elisângela Furtado é professora de Graduação e Pós-graduação. Leciona disciplinas de Teorias da Administração, Administração Geral, Introdução à Administração, Administração e Organização de Empresas, Metodologia Científica e Estudos Organizacionais. Especializada em Organizações, Pessoas, ESG, Diversidade e Inclusão e Cultura Organizacional. Já prestou serviço para Petrobras, Transpetro, Globo, Carrefour, Wabtec, Aon e BS2 pela FDC, além de Nespresso, Caloi e BD pelo Instituto Diversidade. Cientista e Pesquisadora interessada em organizações sociais não hegemônicas, desigualdade sociais, segregação e pluralização da ciência. Publicou pesquisas, artigos e capítulos de livros sobre aspectos organizacionais de comunidades quilombolas, coletivos negros universitários, desigualdade e possibilidades de mudança social. É coordenadora adjunta da área temática Administração Pública, Governo, Estado e Sociedade e Terceiro setor da Encontro Nacional da Associação Nacional dos Cursos de Graduação em Administração (ENANGRAD), é líder da Divisão de Estudos Organizacionais no Tema Universidade, Sociedade e Estado na Contemporaneidade do Encontro Nacional da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Administração (ENANPAD). É filiada à Associação Brasileira de Pesquisadores Negros (ABPN), à Sociedade Brasileira de Estudos Organizacionais (SBEO) e à Associação Brasileira de Estudos Sociais das Ciências e das Tecnologias (ESOCITE.BR). Possui experiência nas áreas de Saúde Pública, Organizações Não Governamentais, Movimentos Sociais e Estudos Organizacionais.