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Empresas familiares, transformação e propósito: um papo com Camila Clemes, diretora de gente e gestão da Biolab

Com mais de 20 anos de experiência no RH e passagem por múltiplos setores, executiva formada em Letras vê na área a possibilidade de retribuir desenvolvimento que o trabalho lhe deu

Bruno Capelas
5 de junho de 2025
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“Estar no RH é uma forma de devolver o que o trabalho me ofereceu durante todos esses anos.” A frase de Camila Clemes, diretora de gente e gestão da farmacêutica Biolab, não deixa esconder: ela é uma apaixonada pelo universo de pessoas. Com mais de 20 anos de experiência na área, a executiva caiu no setor de maneira acidental: ela cursava letras e começou a trabalhar com comunicação corporativa em uma multinacional. “Quando vi, estava cobrindo férias de um profissional da área de benefícios e aquilo tudo começou a fazer sentido para mim”, conta ela. 

Ao longo de duas décadas, Camila acumulou um rol variado de experiências – de uma pioneira área de diversidade ainda em 2009, na Mapfre, à liderança de RHs em empresas de perfil familiar, como a construtora Libercon e a empresa de TI Cast Group. “Foi bem interessante poder olhar para todos os processos de uma vez”, relembra. “Nessa relação, a confiança é a base de tudo. Se você não constrói essa confiança com o acionista, com o dono, você tem pouco espaço para trabalhar”, diz ela, que não se vê mudando de perfil. “Sou suspeita para falar.”

Na entrevista a Cajuína, Camila conta mais sobre sua trajetória e sobre os desafios que enfrenta na Biolab, uma empresa com cerca de 4 mil colaboradores espalhados entre fábricas, centros logísticos e escritórios administrativos em SP e MG. “Nossa agenda é de evoluir para automatizar os processos, desde o processo de recrutamento e seleção até a entrevista de desligamento do profissional que escolhe nos deixar”, explica. Além disso, ela também dá conselhos para RHs que estão na mesma situação e fala sobre como seu propósito se conecta com a área de pessoas. A seguir, confira os principais trechos da entrevista. 

Camila, você é formada em Letras. Como é que você foi parar no RH? 

Costumo dizer que a minha carreira se deu de uma forma pouco provável, sem nenhum planejamento. Eu me formei em Letras muito jovem – por ter o hábito da leitura, achei que era uma escolha. Mas no começo do curso, eu acabei ingressando numa multinacional alemã, a HTB, dentro da área de comunicação corporativa – que ficava dentro de uma estrutura de recursos humanos. Sempre fui muito curiosa e logo entendi como as coisas funcionam. Quando vi, estava cobrindo férias de um profissional da área de benefícios e aquilo tudo começou a fazer sentido pra mim. Depois fui entender o universo de remuneração. De lá para cá, já se passaram 20 anos e sempre fui muito feliz na área. 

Depois da HTB, você ocupou um cargo de analista de diversidade na Mapfre no final da década de 2000. Era uma época em que não se falava tanto no assunto. Como foi essa experiência? 

Tenho muito orgulho de contar sobre isso. A HTB era uma empresa com uma cultura bastante tradicional, e em algum momento eu quis conhecer um mercado diferente, em um RH mais arrojado. Aí fiz um processo seletivo na Mapfre, que é uma multinacional espanhola de seguros. Na época, eles tinham um projeto desafiador por lá, que era implementar a área de diversidade no Brasil, depois de consolidar o tema na Espanha. Eu brinco que fui contratada por falta de opção, porque não havia profissionais no mercado que tivessem experiência no tema. Quando entrei, foi muito legal, porque eu não tinha a menor ideia de onde começar. Tive que estudar bastante, fui atrás de pessoas que ajudaram o Banco Real a ser uma referência no tema na época. A empresa dava muito espaço porque era genuinamente preocupada em desenvolver essa agenda. Foi muito bacana. 

Ao longo da sua carreira, você passou por vários setores – como construção civil, seguros e farmácia. Como foi entender o RH em diferentes setores? 

Foi muito interessante, até porque além dos setores, eu também passei por empresas de diferentes perfis. A HTB e a Mapfre eram empresas multinacionais, e depois eu me direcionei para empresas familiares, “de dono”. Eu estava nesse projeto da Mapfre que era muito legal, mas eu também tinha o desejo da maternidade. Quando meu filho nasceu, quis ficar um ano dedicada à maternidade e saí da empresa. Quando ele completou um ano de idade, eu resolvi voltar para o mercado – e aí voltei numa estrutura menor, “de dono”. É uma estrutura em que eu encontro muita beleza. Tem pessoas que têm dificuldade, outras gostam muito, mas eu me encontrei nesses ambientes. A primeira empresa foi a Libercon, que era uma empresa de engenharia, onde eu pude colocar toda a experiência que eu tinha adquirido anteriormente – tanto o olhar para regras, procedimentos e políticas da HTB como a ideia de um RH inovador e estratégico da Mapfre. Foi bem interessante poder olhar para todos os processos de uma vez. Depois de cinco anos lá, eu quis conhecer um mercado diferente e fui para a Cast Group, uma empresa de tecnologia. Por ser uma empresa de TI, pude usufruir de várias tecnologias para otimizar processos. Por outro lado, também foi uma experiência muito desafiadora, porque o grande desafio em tecnologia é gerar valor para que as pessoas queiram ficar na empresa. Foi onde eu mais me especializei na área de DHO, até que o meu escopo foi aumentando – recrutamento e seleção, consultoria interna, várias oportunidades. No final de 2019, porém, entendi que meu ciclo ali tinha acabado. Eu queria na época trabalhar na indústria, e foi aí que cheguei na Biolab. 

Na Biolab, você foi gerente de DHO, passou pela governança corporativa e assumiu como Diretora de Gente e Gestão em outubro de 2024. Que desafios você destaca no setor de farmacêuticas hoje em dia? 

A Biolab é uma empresa que tem um olhar muito genuíno para as pessoas – e elas percebem esse cuidado nas pequenas coisas. O grande desafio que eu encontro hoje é ter uma área integrada de Pessoas. Hoje, temos muitos processos, muitos programas de cuidado, uma área de saúde corporativa bastante atuante, mas ainda falta integrar mais as áreas do RH. Estamos trabalhando no caminho de ter uma central de dados, uma centralização dos dados das pessoas. Hoje ainda atuamos de maneira segmentada, e essa centralização é importante para automatizar os processos e conseguir gerir as pessoas de forma cada vez mais assertiva. 

Acredito que nenhum RH, no futuro, conseguirá ser estratégico se não combinar esses dois fatores: oferecer produtos, soluções e serviços que façam sentido para as pessoas, aliados à tecnologia. 

Como tem sido o papel da tecnologia nesse desafio? E que conselho você dá para os RHs que se veem na mesma situação que você? 

Hoje, entendo que nossos processos são bastante maduros, mas que ainda fazemos uso limitado da tecnologia – e aqui há uma grande oportunidade. Nossa agenda é de evoluir para automatizar os processos, desde o processo de recrutamento e seleção até a entrevista de desligamento do profissional que escolhe nos deixar. É um desafio entregar, ao longo dessa trajetória, uma experiência que reconheça as pessoas, saiba quem elas são, entregue valor para elas. É o principal espaço de desenvolvimento que temos pela frente. Para os RHs, diria que o principal é ter um posicionamento firme. Eu vejo dois cenários. Um é parecido com o nosso, com processos maduros, mas descentralizados e automatizados. Outro é de empresas que têm os melhores sistemas possíveis, mas ainda não fazem uso deles porque os processos estão imaturos. Vou dizer que prefiro o nosso cenário – porque acredito que é uma situação mais fácil de alcançar uma transformação. Quando a gente evoluir, vamos ter mais tempo dos profissionais e começaremos a girar mais o valor – na conversa com os gestores, com os colaboradores, gerando valor pras pessoas. Acredito que nenhum RH, no futuro, conseguirá ser estratégico se não combinar esses dois fatores: oferecer produtos, soluções e serviços que façam sentido para as pessoas, aliados à tecnologia. 

Você passou por multinacionais e por empresas familiares, “de dono”. Que balanço você faz dessas duas experiências, considerando as diferenças de cultura – e até mesmo o espaço que o RH tem para trabalhar em companhias com uma estrutura menor? 

As empresas “de dono” conquistaram meu coração. Por um lado, elas podem ser desafiadoras. Mas aprendi que, nessa relação, a confiança é a base de tudo. Se você não constrói essa confiança com o acionista, com o dono, você tem pouco espaço para trabalhar. Felizmente, eu tive isso em todas as empresas pelas quais passei – e por isso encontrei muita beleza nesse ambiente de empresa familiar. Sei que algumas pessoas não encontram sentido, não gostam, e está tudo certo, mas sou suspeita para falar. Espero que minha relação com a Biolab seja bastante longa, porque acredito muito no caminho que estamos trilhando. Mas sei que se algum dia eu sair daqui, provavelmente vou parar em outra empresa familiar. 

É o que eu busco fazer hoje: favorecer uma cultura de colaboração, onde as pessoas aprendam umas com as outras, construindo juntas.

Começamos a entrevista falando sobre como você foi parar no RH. Mas o que te faz continuar? Como isso se conecta com o seu propósito? 

É uma ótima pergunta. Eu fiquei dois anos fora do RH na Biolab, e voltar para o RH foi uma alegria muito grande para mim. A área de governança me trouxe muitos aprendizados, mas é a área de pessoas que faz o meu coração bater mais forte. Para mim, o ambiente de trabalho sempre foi um pilar muito importante do meu desenvolvimento pessoal. Comecei a trabalhar muito cedo. Por uma série de fatores pessoais, me apoiei muito no trabalho e encontrei pessoas que me ajudaram muito – e tenho o desejo de retribuir. Aqui na Biolab, encontrei a oportunidade de retribuir o que o trabalho me oferece através das conexões que criei na minha trajetória. Por isso, um dos princípios de gente e gestão que trago na Biolab é conexão: é justamente a conexão entre pessoas, com o líder, com a empresa, que faz com que as pessoas queiram ficar. É o que eu busco fazer hoje: favorecer uma cultura de colaboração, onde as pessoas aprendam umas com as outras, construindo juntas. É uma forma de devolver o que o trabalho me ofereceu durante todos esses anos – e não tem área melhor do que a área de pessoas nesse sentido.

Bruno Capelas é jornalista. Foi repórter e editor de tecnologia do Estadão e líder de comunicação da firma de venture capital Canary. Também escreveu o livro 'Raios e Trovões – A História do Fenômeno Castelo Rá-Tim-Bum'.

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