Criado no final dos anos 1960, Centro WEG é parceria da indústria com o Senai e forma cerca de 800 jovens colaboradores por ano; programa longevo, somado a estágio para graduandos, é responsável por até 60% das contratações anuais da empresa

*Filipe Ducas
No último artigo, falei sobre o Founder Mode como um modelo de liderança que elimina a lentidão, corta a gordura da burocracia e devolve protagonismo real aos times. Mas ficou a pergunta que incomoda: Como alinhar os incentivos para que isso funcione de verdade?
Porque o que não dá é pedir atitude de fundador e pagar como se todo mundo fosse só mais uma engrenagem. O modelo tradicional de remuneração — salário fixo, bônus genérico, e zero conexão com impacto real — é o freio de mão puxado do Founder Mode.
Se você premia quem cumpre processo, vai colher conformismo. Se você premia quem entrega impacto, vai colher autonomia.
Mas isso exige coragem. Porque mexer em incentivos é mexer na fundação de poder de uma organização. É sair do discurso e encarar a real: se o modelo atual de recompensa está sabotando a cultura que você quer construir, ele precisa morrer.
Vamos aos pilares.
Stock options bonitinhas no papel não transformam ninguém em dono. O que transforma é saber que seu esforço muda o seu bolso. E isso só acontece quando o equity tem valor, clareza e consequência.
Na prática: Na Brex, fintech do Vale do Silício, líderes de engenharia, produto e operações têm equity proporcional ao impacto que geram. Um diretor técnico pode ter mais participação que um VP de área suporte. Por quê? Porque ele move o ponteiro da empresa — simples assim.
O erro: Oferecer participação simbólica. Strike price impraticável, cap table obscuro, liquidez inexistente. Isso não é incentivo — é ilusão.
O acerto: Transparência. Clareza de valor. Potencial de ganho real. Só assim a mentalidade de dono deixa de ser slogan e vira instinto.
Bater 15% de crescimento? Reduzir 5% de custo? Parabéns. Você operou a máquina. Mas será que transformou a empresa?
No Founder Mode, o bônus não vai para quem jogou seguro e entregou o previsto. Vai para quem desatou nós, criou atalhos, destravou caminhos que ninguém teve coragem de enfrentar.
Exemplo real: Uma gestora de operações não bateu o SLA previsto. Mas, junto com tecnologia, redesenhou um processo que reduziu o onboarding de parceiros logísticos de 15 dias para 3. Resultado: nova região ativada, receita extra no trimestre. Ela não bateu a meta original — mas criou valor. E isso precisa ser bonificado.
O erro: Tratar número como religião. Ignorar contexto. Premiar quem entregou o esperado, mesmo quando o esperado já não fazia sentido.
O acerto: Criar sistemas híbridos: métrica + julgamento. Valorizar o que não cabe na planilha, mas move a empresa.
Reconhecer é mais do que elogiar. É dar palco, espaço, influência.
Dinheiro compra esforço. Reconhecimento compra lealdade.
Exemplo real: No Nubank, uma líder de atendimento reestruturou a jornada de clientes VIP — por iniciativa própria. O resultado? Churn despencou, NPS disparou. O que fizeram? Deram visibilidade no all-hands, colocaram ela na mesa do comitê executivo e criaram um papel de liderança transversal.
Não foi só bônus. Foi confiança. Foi responsabilidade. Foi poder.
O erro: Achar que reconhecimento se resolve com um post no Slack, um certificado ou uma foto no LinkedIn.
O acerto: Usar reconhecimento como rampa de acesso. Para mais influência. Mais desafio. Mais autonomia.
Empresas que mantêm incentivos conservadores e, ao mesmo tempo, pedem atitude empreendedora, caem num paradoxo tóxico.
O resultado aparece rápido:
Empresas exigem protagonismo, coragem e autonomia, mas continuam premiando quem apenas cumpre metas previsíveis. O resultado? Uma cultura que diz uma coisa — e incentiva outra.
Você diz que quer uma cultura de dono. Mas está disposto a bancar o custo disso? Porque autonomia, impacto e protagonismo não nascem do discurso — nascem das decisões difíceis.
Só os fundadores? Só o C-level? Ou quem carrega a empresa nas costas quando o plano A falha e o caos bate à porta?
Se equity é o símbolo máximo de confiança e pertencimento, por que ele ainda está concentrado em quem passa mais tempo em reunião do que em execução?
Você consegue olhar para o seu time e dizer, com convicção, que o modelo atual de participação é justo? Que quem faz a diferença de verdade tem uma fatia proporcional ao impacto?
Mais: você está disposto a redistribuir poder — não só dinheiro — para garantir que os donos estejam onde o jogo acontece, e não só onde o organograma manda?
Se a resposta for não, então o equity virou privilégio, não incentivo.
Você mede performance ou transformação? Entrega ou consequência?
A métrica que você escolhe é o comportamento que você compra.
Impacto real nem sempre cabe em um KPI. Às vezes, ele aparece quando alguém tem coragem de parar um projeto inútil. Ou quando desafia uma decisão que todos aceitavam por inércia. Ou quando encontra uma alavanca invisível que muda os rumos do negócio — mesmo sem bater a meta.
Você tem espaço no seu sistema para reconhecer isso? Ou está tão preso aos números gerenciáveis que deixou de ver o que realmente importa?
Mais difícil ainda: Você tem coragem de premiar quem cria impacto mesmo que isso exponha que a sua meta estava errada?
Porque se o bônus depende da planilha e não da visão, o seu sistema está comprando conformismo.
Autonomia, sim. Mas autonomia com peso. Com decisão que vale algo. Com consequência prática.
A pergunta real é: Você está disposto a aceitar que líderes vão errar — e que isso faz parte do jogo?
Está pronto para abrir mão do controle central e deixar o protagonismo emergir onde o problema realmente acontece?
Você reconhece quem cria impacto? Ou só quem agrada o chefe?
Você recompensa quem levanta a mão? Ou quem joga seguro e entrega o esperado?
Mais fundo ainda: Você está disposto a bancar decisões impopulares em nome da cultura que quer construir?
Porque no fim, cultura de dono não é o que está no mural da empresa. É o que acontece quando ninguém está olhando — e mesmo assim, alguém toma a frente.
Founder Mode não é apenas um novo estilo de gestão. É uma nova forma de estruturar poder, risco e recompensa. E nenhum modelo se sustenta se os incentivos puxam na direção oposta ao discurso. Se você quer líderes que ajam como fundadores, precisa tratá-los como tais.
Isso exige coragem para romper com modelos herdados. Exige compromisso em redesenhar aquilo que, de fato, molda comportamento: os mecanismos de incentivo.
Do contrário, o “senso de dono” continuará sendo o que já é em muitas empresas: Um slide bonito. E só.
*Filipe Ducas. Formado em Administração, com Especialização em Recursos Humanos e MBA Internacional em Liderança e Gestão, Ducas é uma das referências brasileiras no setor de Remuneração e Benefícios, com uma carreira global e robusta. Co-fundador e Executivo Sênior de Remuneração da Comp, possui mais de 20 anos de experiência em posições de liderança em Remuneração, Operações de RH e People Analytics em gigantes como IBM, Atento, Cognizant, XP Inc. e Grupo OLX. Sua expertise é desenhar políticas e liderar projetos transformadores, com foco em utilizar tecnologia para potencializar o capital humano. Pela Comp, já foi responsável por ajudar mais de 100 empresas a construírem estratégias de remuneração que conectam a estratégia de talentos com o negócio.
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